O primeiro estudo do mundo de “desafio humano” autorizado a expor voluntários à Covid-19, lançado em abril do ano passado, está à procura de novos participantes para a sua segunda fase. Jovens saudáveis foram deliberadamente expostos a uma reinfeção pelo coronavírus com o objetivo de se determinar como funciona o sistema imunitário de uma pessoa que recupera da Covid-19 e quais os níveis de anticorpos ou células T imunes que são precisos para prevenir uma infeção, para se conseguirem desenvolver vacinas ainda mais eficazes.
Esta experiência da Universidade de Oxford foi anunciada três meses depois de a Alemanha ter aprovado este tipo de testes. Num comunicado publicado na última terça-feira, a Universidade explica que esta segunda fase do estudo vai focar-se, precisamente, em determinar que resposta imune é necessária para evitar uma infeção.
Ao mesmo tempo, continua em andamento a primeira fase do estudo, que tentou descobrir também como se desencadeia a própria infeção. Na segunda fase, todos os participantes vão ser infetados com a dose padronizada do vírus que foi estabelecida na primeira etapa.
E em relação ao risco de os voluntários desenvolverem sintomas ainda mais fortes ou danos permanentes?
No final de outubro de 2020, esta questão surgiu depois de um grupo de cientistas do Imperial College London ter anunciado que pretendia infetar deliberadamente voluntários com o vírus, no Reino Unido, para acelerar o processo de desenvolvimento de uma vacina. O anúncio pôs a comunidade científica a discutir até que ponto será ético contagiar os participantes dos ensaios clínicos com uma doença para a qual não existia um tratamento estabelecido.
“Quando existe um tratamento eficaz para a doença provocada pelo agente patogénico a que as pessoas são expostas, não se oferece qualquer dilema ético, porque os participantes são imediatamente tratados”, explicou, na altura, à VISÃO o investigador principal do Instituto de Medicina Molecular (iMM) Miguel Prudêncio. “No caso do SARS- CoV-2, não existindo nenhum tratamento eficaz, a questão ética é completamente diferente”, referiu, acrescentando que “não se pode infetar deliberadamente alguém com SARS-CoV-2 de ânimo leve”. Ao mesmo tempo, disse acreditar que os cientistas apresentaram, na altura, às autoridades britânicas um plano estratégico para minimizar ao máximo o risco para a saúde dos voluntários.
Mais de um ano depois, e com a vacinação em andamento, as preocupações não são tão acentuadas. Os voluntários do estudo da Universidade de Oxford, que terão entre 18 e 30 anos, já têm de ter sido infetados naturalmente pelo coronavírus ou estar vacinados contra a doença e vão realizar uma quarentena durante pelo menos 17 dias. Os investigadores, que acreditam que os participantes serão assintomáticos ou terão sintomas leves, explicam ainda que qualquer um que desenvolva sintomas será tratado com Ronapreve (uma mistura de dois anticorpos monoclonais), desenvolvido pela farmacêutica Regeneron – tanto o Ronapreve como o Regkirona foram os primeiros medicamentos anticorpos monoclonais a receberem um parecer positivo do regulador europeu.
“Os riscos para os participantes serão minimizados, garantindo que estão completamente bem e em forma e, se aplicável, que tenham recuperado completamente da sua primeira infeção por Covid-19”, lê-se no comunicado.
De acordo com os investigadores, “as descobertas do estudo vão ajudar a tornar o desenvolvimento de vacinas muito mais rápido e eficiente”. “Aprendemos muito sobre a Covid-19 nos últimos dois anos, mas o surgimento de novas variantes significa que provavelmente temos de continuar a refinar as vacinas”, explica Helen McShane, que lidera o estudo.