Boa safra de filmes em língua estrangeira para esta edição dos Oscars. Já se havia estreado Parasitas, de Bong Joon-ho, e Dor e Glória, de Pedro Almodóvar, chega-nos agora Corpus Christi – a Redenção, de Jan Komasa, que só por este filme se torna um nome a fixar no bom panorama do cinema polaco contemporâneo. Corpus Christi é um filme espiritual e socialmente intenso que nos leva à teoria das construções e dinâmicas do indivíduo, resumidas pelo filósofo espanhol Ortega y Gasset na frase “O homem é o homem e a sua circunstância”. Aqui corrobora-se a tese com um exemplo prático: mediante a alteração de um contexto, o mesmo indivíduo pode ser um destemido delinquente ou um santo padre. E também pode levar à pergunta: de que serve uma vocação sem as condições para a cumprir?
Em Corpus Christi, acompanhamos Daniel, jovem que, após se ter convertido ao cristianismo num centro de detenção, goza de liberdade condicional e, por um acaso do destino (ou vontade de Deus), faz-se passar por padre e por pároco numa remota vila algures na Polónia. O falso padre, mais perto da essência do cristianismo do que qualquer outro, revela-se a maior bênção que aquela terra já teve.
É forte a ideia de redenção que aqui se joga em dois campos, com algumas portas entreabertas e alçapões. Por um lado, do próprio Daniel, o bom ladrão, que se converte como São Paulo, mas cuja preconceituosa hierarquia da Igreja impede que siga a sua vocação. Por outro lado, a forma como ele, enquanto falso padre, desmancha a hipocrisia social e trata o trauma comunitário de um acidente de carro que vitimou seis jovens da vila. Corpus Christi é um filme intenso, eloquente, imageticamente forte e com um trabalho tremendo de Bartosz Bielenia, um daqueles atores cujo rosto vale por mil palavras.
Veja o trailer do filme
Corpus Christi – a Redenção > De Jan Komasa, com Bartosz Bielenia, Aleksandra Konieczna, Eliza Rycembel > 115 minutos