1. Ali Está o Taras Shevchenko com Um Tiro na Cabeça
Ana França
O fim da guerra da Ucrânia, dizem os especialistas, ainda está longe, mas, à beira de se completar um ano de conflito, já é possível fazer um balanço da sua destruição – tanto física quanto humana. Para esse fim, Ana França oferece-nos, no seu primeiro livro, um contributo valioso. No início da invasão russa, a jornalista do Expresso esteve por três vezes na Ucrânia – logo em fevereiro e com regressos em abril e maio. Às reportagens que então publicou junta agora um diário constituído por notas pessoais e por retratos de quem viu a vida totalmente desfeita. Nesse sentido, a simples contabilidade do número de refugiados ao lado da data de cada entrada deste diário (e sempre em número crescente) é, por si só, elucidativa. No espaço de dois meses, uma parte significativa da população ucraniana passou a viver com a casa às costas. Por ter sido enviada inicialmente para Lviv, Ana França documenta especialmente bem o drama dos deslocados e os esforços para os receber na fronteira com a Polónia, mas são igualmente impressionantes as visitas a Bucha e a Irpin, assim como a chegada a Kiev. O registo da sua experiência (acompanhada pelos repórteres fotográficos Tiago Miranda e Rui Duarte Silva) humaniza e interpreta os acontecimentos, na medida em que é capaz de se aproximar do quotidiano, que não deixa de resistir no presente, e de lançar sonhos para o futuro. Tinta-da-China, 256 págs., €17,90
2. Ucrânia Insubmissa
Cândida Pinto e David Araújo
A 24 de fevereiro de 2022, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, a jornalista Cândida Pinto e o repórter de imagem David Araújo encontravam-se em Kiev, ao serviço da RTP, onde permaneceram durante semanas. Nas suas reportagens, deram-nos uma imagem da guerra, tanto na dimensão política como humana. O livro que agora publicam é a continuação da partilha desse conhecimento, que vem do terreno e que se faz de histórias de vida, de tragédias e, sobretudo, de atos de resistência. Em cada reportagem, documentada com fotografias, temos a experiência de quem decidiu ficar (ou não pôde sair) e de quem, apesar de tudo, procurou encontrar um fio de normalidade. O casamento de dois militares é, nesse sentido, um corolário destes relatos, em que toda a experiência de Cândida Pinto vem ao de cima, socorrendo-se aqui de uma linguagem ao mesmo tempo precisa e expressiva. Dom Quixote, 320 págs., €22,90
3. Viagem ao Coração de Uma Guerra Futura
Paulo Moura
“Viajar para a Ucrânia em 2022, dois meses após o início da guerra, foi como visitar um velho amigo que tivesse adoecido gravemente.” A frase com que Paulo Moura abre o seu mais recente livro é bem ilustrativa da convivência que o grande repórter tem com o Leste da Europa. É dela que parte para tentar contextualizar a invasão russa, na certeza de que “os acontecimentos se iluminam uns aos outros”. Esta viagem no tempo, suportada por reportagens que escreveu, apontamentos de viagens e memórias, inicia-se em 1995, na Rússia, e passa por geografias-chave do atual conflito: as novas fronteiras da Europa, a anexação da Crimeia e a revolução ucraniana de 2014. Histórias (com muitos e extraordinários protagonistas) que são afluentes de um mesmo rio caudaloso e imprevisível, que desaguou em 2022 na Ucrânia. Objetiva, 280 págs., €16,65
4. As Guerras do Trigo
Scott Reynolds Nelson
Tendo em conta a sua complexidade geopolítica, a guerra na Ucrânia pode ser analisada a partir dos mais diversos pontos de vista. Um dos que têm sido mais evidenciados fora do âmbito militar é o dos cereais e respetiva exportação. Como oitavo maior produtor de trigo do mundo, a Ucrânia tem uma enorme importância na alimentação mundial, o que explica os acordos entre os beligerantes nesta área. Neste livro, o norte-americano Scott Reynolds Nelson dá-nos o enquadramento histórico do papel do trigo ao longo dos séculos, mostrando como ele foi mesmo capaz de decidir o destino de impérios. Ainda que se centre em particular no caso norte-americano (e na sua importância crescente a partir do século XIX), é uma obra indispensável para se compreender os vários interesses em jogo e a cadeia de interdependências, que justificam o acentuado aumento de preços de bens essenciais. Zigurate, 382 págs., €23,70