Comparada com as grandes obras corais (paixões, missas, cantatas, motetes) e com as peças orquestrais (Concertos Brandeburgueses, concertos para cravo e violino, suites), a música de câmara de Bach é um gosto um pouco mais exclusivo, se falarmos de popularidade. No entanto, mesmo quem tenha dificuldade em assimilar as partitas para violino solo pode apreciar as sonatas para violino e teclas, em especial numa gravação como esta, onde não encontramos os problemas de desequilíbrio sonoro que às vezes afligem versões, como esta, onde o cravo é substituído pelo piano.
Aqui, o pianista David Fray, suave, lírico e aguerrido conforme a circunstância, sempre com um toque de idiossincrasia, é o parceiro ideal do violino. A captação de som também ajuda, e convém reconhecê-lo. Tudo isso é essencial, dado que uma das inovações destas obras, que datam da maturidade de Bach, foi a utilização do cravo obbligato, tão independente e infungível como o outro instrumento. Três vozes independentes, duas das quais a seu cargo, permitem explorar todos os cambiantes harmónicos, melódicos e de textura nas estruturas de fuga nos movimentos rápidos.
Com ambientes que vão desde a ação dramática até à melancolia tranquila, passando por um daqueles movimentos jubilosos que tanto nos podem dar a impressão de estarmos a entrar num espaço em festa como a praticar uma caminhada circunspecta (cada ouvinte é livre de criar as suas próprias imagens, obviamente), estas sonatas são expoentes do reportório. O presente CD é, também, mais uma prova de que, no caso de Bach, renunciar ao piano em nome do purismo seria uma perda substancial.