

O Poder, de Naomi Alderman (Saída de Emergência, 368 pp, €17,70), centra-se em quatro personagens principais (Roxy, Tunde, Margot, Allie), cujos destinos e pontos de vista são conhecidos em capítulos alternados. Obama foi um dos leitores que ficaram (bem) impressionados
Um romance de uma mulher, sobre um mundo dominado por mulheres, vencedor de um prémio só para livros de mulheres? Antes que a desconfiança tome conta da leitora ou do leitor, convém dizer que nada é simples em O Poder, inesperado e surpreendente romance futurista da inglesa Naomi Alderman, distinguido em 2017 com o prestigiado Baileys Women’s Prize For Fiction.
Num futuro distante, são as mulheres quem mais ordena. Uma mutação genética, de origem misteriosa, dotou-as de uma arma letal: uma “meada na clavícula” que gera uma fulminante corrente de energia. É neste mundo feminino que um historiador decide perceber como tudo começou, recuando aos anos que antecederam o cataclismo. Através deste artifício literário, O Poder afirma-se, em simultâneo, como romance histórico e futurista. Propõe uma sociedade diferente, mas descreve-a com o tom melancólico da arqueologia. Cobrindo uma década, acompanha-se, ano a ano, a marcha dos acontecimentos: a excitação inicial, a euforia das redes sociais, as religiões messiânicas, a contraofensiva masculina, a intriga internacional, o descontrolo das massas, os abusos de poder, a corrupção, a tentação da bomba atómica…
A melhor ficção científica, tal como o mais estimulante romance histórico, é aquela que fala do presente. E essa é a força deste segundo romance de Naomi Alderman. Ao contrário de Handmaid’s Tale, de Margaret Atwood, O Poder afirma-se pela negativa. Ao propor uma deriva totalitária feminina, a escritora talvez queira que passe pela cabeça do leitor, mais ou menos incauto, a ideia de que, afinal, “elas fariam o mesmo”. Mas o coração deste enredo galvanizante é outro: “O poder não quer saber quem o usa.” O que fará quem o tem hoje?