“Quién me va a curar el corazón partió?”, perguntava o músico espanhol Alejandro Sanz, numa das suas canções mais populares. Ora, aqui não falamos de desgostos de amor, mas de lesões no tecido cardíaco que poderão regenerar-se com a aplicação de oxitocina, segundo um estudo da Universidade Estadual de Michigan, recentemente divulgado. Em teoria, aquela que é conhecida como a “hormona do amor”, poderá até ser usada, futuramente, no tratamento de ataques cardíacos.
Conhecida por promover laços sociais e gerar sentimentos prazerosos, a oxitocina tem muitas outras funções, como a regulação da lactação e das contrações uterinas nas mulheres e a regulação da ejaculação, o transporte de espermatozoides e a produção de testosterona nos homens. Agora, o estudo publicado na revista Frontiers in Cell and Developmental Biology, no passado dia 30, feito em laboratório com peixes-zebra (conhecidos pela extraordinária capacidade de regeneração dos seus órgãos) e culturas in vitro de células humanas, mostra que a hormona estimula as células-tronco derivadas da camada externa do coração (epicárdio) a migrar para sua camada intermediária (miocárdio) e ali se desenvolver em cardiomiócitos, células musculares responsáveis pelas contrações cardíacas. A investigação está numa fase inicial, mas os cientistas acreditam que esta nova descoberta poderá um dia ser usada para promover a regeneração do coração humano após um ataque cardíaco.
Os cardiomiócitos são considerados os halterofilistas do coração, que permitem bombear o sangue. Quando estas células altamente especializadas são danificadas, não se consegue repará-las. Mas outros estudos provaram que há um subconjunto de células na membrana mais externa do coração, o epicárdio, que adquire uma nova identidade após uma lesão. Essas células, conhecidas como EpiPCs, migram para a camada de tecido cardíaco onde os músculos residem e transformam-se em células semelhantes a tronco, que podem se transformar em vários tipos de células cardíacas, incluindo cardiomiócitos. “Pensem nas EpiPCs como os pedreiros que reabilitaram catedrais na Europa durante a Idade Média”, comparou Aitor Aguirre, professor da Universidade Estadual de Michigan, responsável pelo estudo. Só que, nos humanos, esse processo desdobra-se de forma muito ineficiente e incapaz de se traduzir numa regeneração significativa dos tecidos.
Ao encorajar, através da aplicação da oxitocina, mais células epicárdicas a transformarem-se em cardiomiócitos, os cientistas poderiam acelerar o processo e ajudar o coração a se reconstruir após uma lesão. “A oxitocina é amplamente utilizada noutros tratamentos clínicos, portanto, redirecioná-la para as lesões cardíacas não implica grande exercício de imaginação. Mesmo que a regeneração do coração seja apenas parcial, os benefícios para os pacientes podem ser enormes”, acredita Aguirre. Mais ensaios clínicos, em animais e humanos, precisam de ser conduzidos. As doenças cardiovasculares são das principais causas de mortalidade em todo o mundo, pelo que a comunidade científica estará certamente atenta a esta investigação.