Pode não haver uma fórmula certa para prevenir o risco de desenvolver cancro. Mas adotar um estilo de vida saudável pode ajudar, mesmo que tenhamos uma história clínica familiar da doença. “Sabemos que principalmente pessoas com familiares diretos, como pais e irmãos, com cancro, têm um risco aumentado de vir a desenvolver uma doença cancerígena”, começa por avisar Mário Dinis Ribeiro, diretor do Serviço de Gastrenterologia do IPO do Porto. Nestes casos, o especialista do IPO aconselha a consultar o médico para saber que tipo de medidas adotar.
Fazer exames médicos de rotina, aderir aos diferentes programas de rastreio e ter uma vida ativa e saudável são ajudas fundamentais
Ainda assim, há atitudes que podemos ter no quotidiano, como fazer exames médicos de rotina, aderir aos diferentes programas de rastreio oncológico e ter uma vida ativa e saudável, aconselha, Miguel Barbosa, diretor do Serviço de Oncologia do Hospital de São João, no Porto. O truque está também em evitar hábitos nocivos para a saúde, como fumar e beber álcool, além de apostar no equilíbrio entre uma alimentação equilibrada, uma boa higiene de sono e a prática de atividade física, nota Miguel Barbosa. O oncologista deixa, contudo, um alerta: “As pessoas sedentárias têm maior risco de desenvolvimento de cancro.” É caso para dizer, mexa-se pela sua saúde. “Uma das coisas mais importantes que pode fazer para diminuir o risco de cancro é manter um peso saudável”, acrescenta, Paulo Cortes, presidente do Conselho Científico da Sociedade Portuguesa de Oncologia.
Esteja também atento ao aparecimento de sintomas, aconselha, o médico Mário Dinis Ribeiro, “como mudanças na coloração da pele e dos sinais, alterações da voz, tosse e dores persistentes, alterações do trânsito intestinal ou digestivo, o surgimento de diabetes e emagrecimento sem causa aparente”. Por isso, avisa, “não hesite em consultar o seu médico se tiver estes sintomas”. Os dois especialistas são unânimes em defender que quanto mais cedo se procurar ajuda médica, maior probabilidade existe de prevenir a doença cancerígena.
1. Faça exames com regularidade
Consulte o seu médico de Medicina Geral e Familiar com regularidade e faça exames de saúde de rotina, o chamado check-up anual, para controlar a sua saúde e prevenir doenças. Esta é uma das armas para detetar precocemente o risco de desenvolver cancro, aconselha Miguel Barbosa, diretor do Serviço de Oncologia do Hospital de São João, no Porto.
Entre os exames a realizar estão, por exemplo, análises clínicas, medição da tensão arterial, eletrocardiograma, rastreios visuais e auditivos, colonoscopia, que permite detetar precocemente o cancro do cólon, ou a ecografia mamária e o teste de papanicolau, no caso da mulher.
2. Tenha as vacinas em dia
Tenha o plano vacinas atualizado para se proteger a si e aos outros, “em termos de infeção e também para impedir o desenvolvimento de cancro”, aconselha o oncologista Miguel Barbosa. O médico do Hospital de São João sublinha que “há vacinas que têm um papel na prevenção do cancro, por exemplo a vacina contra o vírus do papiloma humano (HPV) que previne o desenvolvimento do cancro do colo do útero”. E que é administrada em rapazes e raparigas a partir dos 10 anos. O HPV é uma das infeções de transmissão sexual mais comuns em todo o mundo que pode provocar cancro e doenças genitais.
3. Acabe com o vício do tabaco
“Está cientificamente provado que o tabaco aumenta o risco de pólipos e de cancro”, avisa Mário Dinis, do IPO do Porto. “Ao fumar o cigarro, está a inalar uma série de substâncias nocivas que contribuem para o desenvolvimento de cancro”, anui, por sua vez, Miguel Barbosa, do Hospital de São João.
4. Evite beber álcool
“O álcool induz direta ou indiretamente alterações ao nível dos tecidos, e processos inflamatórios, sendo um fator de risco para os cancros do esófago, fígado, pâncreas e alguns tipos de cancro do estômago”, alerta o médico do IPO, Mário Dinis Ribeiro. Por exemplo, “um fumador, mesmo que beba pouco, aumenta drasticamente o risco de ter um carcinoma do esófago”. No caso do cancro do pâncreas, nota, o tabaco e o álcool também são fatores de risco. O diretor do Serviço de Gastrenterologia do IPO do Porto avisa ainda que “o álcool é uma causa importante de cirrose hepática e é, por si só, um fator de inflamação e de cancro. E está associado indiretamente a outras formas de cancro, por induzir formas de obesidade e excesso de peso”.
5. Pratique exercício físico
Tenha uma vida mais ativa e pratique exercício físico. O oncologista Miguel Barbosa sugere, por exemplo, fazer uma caminhada de cinco quilómetros, três vezes por semana, contrariando o sedentarismo que é um dos riscos de desenvolver cancro. “Sabemos que a prática de exercício físico leva a uma maior ativação dos nossos órgãos e sistemas”, nota o oncologista do Hospital de São João. Miguel Barbosa explica que, que no caso de “surgirem alterações nesses órgãos e sistemas, o nosso sistema imunitário já estará mais atento e irá contrariar essas alterações logo à nascença, impedindo o desenvolvimento de cancro”.
6. Participe nos rastreios de cancro
Mesmo sem ter sintomas, adira ao programa de rastreios como o do cancro da mama, colorretal e colo do útero. Os médicos são unânimes em defender que estes rastreios têm contribuído para a deteção precoce de cancro e redução da incidência da mortalidade. A realização de cada rastreio depende da idade e do sexo. Para o cancro da mama, por exemplo, é recomendada a realização da mamografia a partir dos 50 anos até aos 69 e a cada dois anos. No caso do cancro colorretal, o teste de pesquisa de sangue oculto nas fezes é aconselhado a homens e mulheres dos 50 aos 74 anos. Já o rastreio do cancro de colo do útero é um teste feito a mulheres, entre os 25 e os 60 anos, para examinar as células do colo do útero e que pesquisa o vírus do papiloma humano (HPV).
7. Tenha um sono regular
Existem evidências científicas de que o sono é um aliado da prevenção de doenças. “As perturbações no relógio biológico do corpo, que controla o sono e milhares de outras funções, podem aumentar as probabilidades de cancro da mama, do cólon, do ovário e da próstata”, alerta Paulo Cortes, presidente do Conselho Científico da Sociedade Portuguesa de Oncologia. O também coordenador de Oncologia do Hospital Lusíadas Lisboa explica que, “durante o sono, o cérebro produz a melatonina que é uma hormona que pode ter propriedades antioxidantes que ajudam a prevenir danos nas células que podem causar o cancro”. A melatonina também reduz a produção de estrogénio a partir dos ovários. Assim, a falta de sono origina a produção de pouca melatonina. “Esta série de eventos pode expor as mulheres a níveis elevados de estrogénio e pode aumentar o risco de cancro da mama”, avisa. Também a exposição à luz, enquanto se trabalha por turnos noturnos, durante vários anos, pode reduzir os níveis de melatonina, encorajando o cancro a crescer”.
8. Faça uma alimentação saudável e equilibrada
Privilegie uma dieta mediterrânica rica em fibras, proteínas, leguminosas e frutas que “fomenta uma boa absorção energética, um bom funcionamento intestinal, o equilíbrio da flora bacteriana a nível gastrointestinal, contribuindo para uma vida mais saudável”, aconselha o oncologista Miguel Barbosa. Está provado que as frutas e as hortícolas promovem um efeito antioxidante e prebiótico. O oncologista Paulo Cortes, aconselha, por isso, “a encher pelo menos dois terços do seu prato com legumes, fruta, grãos inteiros ou leguminosas (feijão e ervilhas), e um terço ou menos com proteínas animais”.
Reduza o consumo de bebidas açucaradas, gorduras, carnes vermelhas, alimentos processados e carnes fumadas. Mais, alerta Miguel Barbosa: “Evite comer alimentos fumados, para prevenir um maior risco de desenvolvimento de cancro gástrico, colorretal, ou seja, tumores digestivos.”
O poder da alimentação
A alimentação é um dos muitos fatores associados ao cancro e o seu impacto pode ser também notório nos tratamentos
O papel da alimentação no cancro não é novidade e estudos já mostraram que “cerca de 30%” dos casos poderiam ser prevenidos “com alterações de comportamentos alimentares”, diz Paula Alves, diretora do Serviço de Nutrição e Alimentação do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil. Os cancros gastrointestinais, do estômago e do cólon são os que mais ficam à mercê da má alimentação, mas “foi, ainda, estabelecida uma associação causal entre a ingestão de álcool e o risco de cancro na cavidade oral, faringe, laringe, esófago, fígado, cólon-reto e mama”, conta a nutricionista Joana Bernardo, do Hospital Lusíadas Lisboa. Em 2015, a Organização Mundial da Saúde classificou as carnes processadas como cancerígenas e a carne vermelha como “provavelmente” cancerígena, no entanto, o cancro não se previne apenas não comendo um determinado alimento. O que poderá, de certo, fazer a diferença é todo um conjunto de maus hábitos alimentares e quantidades desajustadas e, aqui, entra a importância de seguir um padrão alimentar mediterrânico, visto como preventor, por ser rico em alimentos de origem animal e gorduras saudáveis e por privilegiar o pescado face à carne.
Reforço no tratamento
A boa alimentação é crucial no pós-diagnóstico, com impacto direto no bem-estar do doente e no tratamento, uma vez que “o estado nutricional pode afetar a progressão, a sintomatologia, a resposta aos tratamentos e a recuperação, exercendo influência no prognóstico do cancro e na qualidade de vida”, destaca Joana Bernardo. No fundo, a alimentação adequada pode ser a chave para evitar que os tratamentos sejam “suspensos por culpa de maus estados nutricionais”, diz Paula Alves, também nutricionista no Hospital de Santa Maria – Porto.
O microbiota intestinal, conjunto de microrganismos que habitam nos intestinos, é visto como uma das principais áreas de interesse no cancro, podendo interferir em todas as fases da doença, sobretudo no controlo dos efeitos adversos e no aumento da eficácia da terapêutica usada. “A resposta à imunoterapia parece depender das bactérias intestinais”, explica o médico Nuno Gil, da Fundação Champalimaud. A alimentação saudável, claro, é “um dos fatores mais determinantes para a composição do microbiota intestinal”, estando já provado que “o consumo excessivo de alimentos hipercalóricos, processados, ricos em gordura saturada, açúcares e sal está associado à sua deterioração, com possíveis consequências para a saúde”, conclui Joana Bernardo, que volta a destacar a dieta mediterrânica como aliada.
9. Amamente o seu bebé
“Sabemos que as mulheres que têm o primeiro filho em idade mais jovem, que têm o maior número de filhos e amamentam por um tempo mais prolongado, têm um menor risco de desenvolvimento de cancro da mama”, nota o oncologista do Hospital de São João.
10. Cuidado com a obesidade
“A ligação entre a obesidade e o risco de cancro é clara”, nota o oncologista Paulo Cortes, porque “a investigação mostra que o excesso de gordura corporal aumenta o risco de vários cancros, incluindo colorretal, da mama, na pós-menopausa, do útero, esófago, renal e pancreático”. Mais, avisa: “O risco é tanto maior quanto mais peso se ganha e quanto mais tempo se tem excesso de peso.” Esse risco depende de vários fatores, como a idade e a genética. Ainda assim, o presidente do Conselho Científico da Sociedade Portuguesa de Oncologia explica que esse risco pode ocorrer, “em grande parte, devido à inflamação causada pela gordura visceral que é a gordura que envolve os seus órgãos vitais”. Ou seja, descreve, “a gordura extra é ativada, enviando sinais para o resto do corpo. Estes sinais podem dizer às células do nosso corpo para se dividirem mais frequentemente, o que pode levar ao cancro”. O oncologista Miguel Barbosa alerta para o facto de “uma das principais fontes de estrogénio ser a gordura no corpo da mulher e, por isso, o risco de desenvolvimento de um cancro hormono-sensível, como o cancro da mama, ser maior nas pessoas obesas”.
11. Proteja-se dos poluentes e das radiações
Tenha cuidado e proteja-se sempre que estiver exposto, na sua atividade profissional, a poluentes, agentes carcinógenos e radiações. O médico Miguel Barbosa sugere, por exemplo, “a utilização de fatos protetores, máscaras e óculos de proteção”.
12. Cuidado com a exposição solar
Tenha cuidado com a exposição à radiação ultravioleta e proteja a pele, principalmente se tiver uma pele mais clara, aconselha o médico Miguel Barbosa. “A exposição solar prolongada, ao longo de várias horas e dias, contribui para o desenvolvimento de vários tipos de cancro de pele, especialmente o melanoma, que é um cancro perigoso, com uma taxa de mortalidade bastante elevada”, avisa o oncologista do Hospital de São João. Evite a exposição solar nas horas de maior intensidade, use chapéu e protetor solar.