Na edição do Festival Eurovisão da Canção deste ano, que se realizou em maio, os artistas foram testados à Covid-19 através da respiração. O aparelho utilizado foi desenvolvido pela empresa holandesa Breathomix, é semelhante a uma garrafa de água e analisa a composição química da respiração.
O teste leva entre dois a três minutos a ser realizado, o ar expirado é medido em tempo real (<1 minuto) e o resultado é introduzido numa base de dados, sendo divulgado no momento. Pode ser negativo ou inconclusivo e, neste último caso, é feito um teste PCR para que se possa concluir se a pessoa está ou não infetada.
O SpiroNose consiste em 7 sensores diferentes que medem a quantidade de compostos orgânicos voláteis que são expirados e a quantidade de compostos que existem no ar. A combinação de sinais do sensor gera um perfil de respiração individual e os dados obtidos são comparados com os padrões de probabilidade existentes nas bases de dados, ou seja, os padrões normais de respiração, o que é suposto ser libertado quando se está saudável.
“É um processo complicado, não é só respirar. Coloca-se uma mola no nariz e o aparelho na boca. Respira-se normalmente cinco vezes e depois respira-se fundo, aguenta-se alguns segundos e expira-se até não haver mais ar”, descreveu à VISÃO Guilherme Salgueiro, teclista dos The Black Mamba, a banda que representou Portugal no concurso.
Por todo o mundo, estão a ser desenvolvidos outros testes à Covid-19 baseados na respiração. A agência de saúde de Singapura aprovou dois testes de sopro, o BreFence Go, da empresa Breathonix, e o TracieX, da Silver Factory Technology. Antes da pandemia, a empresa holandesa estava a desenvolver um “nariz eletrónico” para detetar várias outras doenças respiratórias. “Treinámos o nosso sistema, ‘é assim que cheira a asma, é assim que cheira o cancro de pulmão'”, explicou ao New York Times Rianne de Vries, diretora científica e de tecnologia da empresa. “Portanto, é construir um grande banco de dados e encontrar padrões numa grande base de dados”.
No caso da Covid-19, os cientistas mediram “milhares de doentes com coronavírus e pessoas que não tinham o vírus, por isso sabemos qual é o perfil respiratório médio de pessoas infetdas e de e pessoas sem vírus”, explicou Rianne de Vries.
As amostras de respiração de pessoas infetadas tinham níveis mais altos de aldeídos, compostos produzidos quando as células ou tecidos são danificados por inflamação, e cetonas, o que se encaixa com pesquisas que sugerem que o vírus pode danificar o pâncreas e causar cetose. Níveis de metanol mais baixos também foram encontrados, o que poderia ser um sinal de que o vírus tinha inflamado o sistema gastrointestinal ou matado as bactérias produtoras de metanol que ali vivem.
Resultados são positivos, mas investigações devem continuar
O estudo realizado ao SpiroNose, que decorreu em Amesterdão, no segundo semestre de 2020, e incluiu mais de 4500 pessoas com sintomas iniciais sugestivos de Covid-19, ou que tinham estado em contacto com um caso positivo, foram submetidas a uma zaragatoa combinada (garganta e nasofaringe), seguida pela avaliação do ar expirado através da tecnologia eNose.
Os resultados indicaram que o dispositivo identificou corretamente pelo menos 98 por cento das pessoas infetadas com o vírus, mesmo no grupo de participantes assintomáticos, mas teve uma taxa relativamente alta de falsos positivos. Quanto aos resultados negativos podem excluir uma infeção de forma confiável em 70-75%. Apesar dos dados obtidos, a investigação ainda não foi revista pelos pares.
Há algum tempo que os cientistas se nteressam pela criação de dispositivos portáteis capazes de detetar doenças de uma maneira rápida e indolor, através da respiração. O processo é possível porque, ao expirarmos, libertamos milhares de gases (compostos orgânicos voláteis), que resultam da respiração, digestão, metabolismo celular e outros processos fisiológicos. A possibilidade de obter resultados com estes dados deve-se ao facto de as doenças poderem alterar a mistura de compostos orgânicos voláteis que o corpo emite.
As dificuldades, no entanto, residem na possibilidade de diferentes doenças poderem causar alterações respiratórias semelhantes ou o tipo de dieta que se tem poder afetar os elementos químicos expirados, tal como o consumo de tabaco e o consumo de álcool, que também pode dificultar a identificação de doenças. Atualmente, os investigadores estão confiantes de que os avanços na tecnologia de sensores e o desenvolvimento de novos algoritmos, combinados com novas investigações e investimentos estimulados pela pandemia podem permitir a produção de aparelhos de sopro de qualidade.
A utilização deste tipo de aparelhos é uma mais-valia na identificação do vírus, já que pode ser utilizado como um teste de triagem para definir quem precisa de um teste de confirmação adicional. Em Israel, investigadores da Universidade de Ben-Gurion desenvolveram um teste rápido, que deteta o coronavírus em apenas um minuto e obteve uma taxa de sucesso de 90 por cento.
“Continuamos a realizar testes clínicos e comparamos amostras de doentes com covid-19 com amostras de doentes com outras doenças para ver se conseguimos identificar os diferentes estágios da infeção por covid-19”, explicou Gabby Sarusi ao jornal israelense Breaking Israel News.
Nos EUA, Cristina David, engenheira da Universidade da Califórnia, juntamente com a sua equipa de investigação, está a analisar o que é conhecido como condensação da respiração expirada, uma solução concentrada das minúsculas gotículas de fluído, ou aerossóis, que estão presentes na respiração e contêm todos os tipos de moléculas biológicas complexas. O objetivo é encontrar biomarcadores para ajudar os médicos a prever quais os doentes infetados com Covid-19 que têm maior probabilidade de adoecer gravemente.
Na Universidade de Ohio, também nos EUA, um grupo de cientistas desenvolveu um aparelho que colhe amostras da respiração para os principais biomarcadores da infeção. À semelhança do SpiroNose, este também deteta compostos orgânicos voláteis e óxido nítrico. O aparelho é baseado na invenção de Perena Gouma, líder da investigação, que consiste num monitor portátil que, através da respiração, deteta a gripe antes dos sintomas aparecerem.