O desabafo chega no final: “Isto é bom, teoricamente é uma vantagem, mas as pessoas que tenham calma. Face a um resultado negativo, não podem começar a organizar jantares ou a deixar de usar máscara. Esse é o meu maior medo.”
Rui Pinto, professor da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa e presidente do Colégio de Especialidade de Análises Clínicas da Ordem dos Farmacêuticos, tinha acabado de dizer que a disponibilização dos testes rápidos de antigénio de uso profissional a leigos “pode dar bons resultados se eles forem bem utilizados”. Lá estava a conjunção – “se” – a servir de alerta.
“É mais uma ferramenta, em complemento daquilo que é feito pelos profissionais”, sublinhara este perito do Infarmed em dispositivos médicos para diagnóstico in vitro (vulgo kit de reagentes). Mas não basta seguir à risca as instruções da bula destes autotestes, que agora podem ser comprados em farmácias, parafarmácias e supermercados.
“É sempre preciso transmitir o resultado, seja ele positivo, negativo ou inconclusivo”, nota Rui Pinto. “Se a pessoa tem sintomas ou esteve em contacto com alguém infetado, deve ligar para a Linha de Saúde 24, porque o principal objetivo dos autotestes é isolar os casos positivos e conter um eventual surto.”
Essa é a intenção do regime excecional e temporário que possibilita a realização de autotestes rápidos (resultado em 15-30 minutos) para a deteção de antigénio de SARS-CoV-2. “[Eles] constituirão, assim, um instrumento adicional de reforço da resposta nacional de combate à Covid-19”, lê-se na circular conjunta da Direção-Geral da Saúde, do Infarmed e do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge sobre a portaria que estabelece o regime excecional.
“Ao se disponibilizar à população esta ferramenta de rastreio da infeção de maneira o mais dispersa possível no nosso País, parte-se do princípio de que as pessoas têm consciência do que vão fazer, sabem executá-lo bem e, no final, vão transmitir o resultado às autoridades competentes”, diz o mesmo especialista. “Vamos ver na prática se ela tem muita adesão ou não.”
Note-se que estes autotestes resultam de uma adaptação dos testes para uso profissional. São vendidos à unidade, com todo o material necessário (só não é fornecido o cronómetro/relógio) e com uma “bula” escrita de maneira clara, de forma a que o resultado não seja prejudicado por uma má manipulação por parte de leigos. E são feitos também por zaragatoa, mas em casa e apenas por exsudado nasal, sem o já nosso conhecido cotonete longo ter de ir à faringe.
A “bula” traz instruções detalhadas e profusamente ilustradas. Entre elas, Rui Pinto destaca alguns cuidados a ter. Para começar, deve-se verificar uma coisa tão simples como se a embalagem está intata e se todos os componentes são fornecidos. Só depois se coloca a pequena “cassete” numa superfície plana e confirma-se que os reagentes estão à temperatura ambiente.
“O paciente vai usar a zaragatoa no interior do nariz no máximo um centímetro, um centímetro e meio, fazendo um movimento giratório e tocando nas paredes internas das fossas nasais”, ensina Rui Pinto. “E é preciso fazer imediatamente o teste depois de usar a zaragatoa. Temos de cumprir escrupulosamente o tempo que o fabricante diz, caso contrário, o teste é para ser descartado.”
No final, a cassete, as luvas, a zaragatoa e o reagente, tudo deve ser tratado como as máscaras descartáveis – vão para o lixo indiferenciado, porque e parte do princípio de que o risco é semelhante. Aliás, a solução usada nos autotestes tende a inativar o vírus.