Já decorrem ensaios clínicos com o objetivo de avaliar a segurança e a eficácia das vacinas que protegem contra a Covid-19 nos mais jovens.
Atualmente, as farmacêuticas norte-americanas Pfizer, Moderna e Johnson & Johnson estão a testar as suas vacinas em maiores de 11 anos, já a britânica AstraZeneca avançou com ensaios clínicos que incluem crianças a partir dos 6 anos.
Os primeiros resultados destas investigações deverão ser conhecidos no verão, mas “não é expectável que as vacinas não sejam eficazes”, avança a infeciologista pediátrica Maria João Brito.
Entre as mais de 16 mil vítimas provocadas pelo SARS-CoV-2, em Portugal, apenas quatro são de jovens com menos de 20 anos
A médica do Hospital Dona Estefânia, em Lisboa, explica que não foi dada prioridade às crianças na investigação das vacinas porque o objetivo imediato era travar os casos graves e a mortalidade causada pela doença, situações muito mais frequentes nos idosos e nas pessoas com várias doenças associadas.
Em Portugal, entre as mais de 16 mil vítimas provocadas pelo SARS-CoV-2, apenas quatro são de menores de 20 anos, que representam cerca de 15% do número de infeções registadas no País (abaixo dos 9 anos os casos não vão além de 5,5% do total). “Nas crianças, a doença é residual”, sublinha a infeciologista.
Além de infetar menos as faixas etárias mais jovens, a Covid-19 também lhes causa menos complicações graves. Contudo, mesmo parecendo transmitir menos a doença, será que os mais novos podem funcionar como reservatórios do vírus? “É muito precoce fazer previsões”, afirma, cautelosa, Maria João Brito.
A médica dá o exemplo da vacina da gripe: apesar de as crianças serem grandes reservatórios do influenza, são, sobretudo, os mais velhos e os grupos de risco que são inoculados. Portanto, só a evidência científica poderá vir a esclarecer a relevância, ou não, de os mais novos serem vacinados contra o coronavírus.
A inoculação das crianças poderá ser fundamental para prevenir uma complicação invulgar provocada pelo SARS-CoV-2, a Síndrome Inflamatória Multissistémica Pediátrica (MIS-C). A infeciologista reitera que esta é uma consequência rara da Covid-19 e que, precisamente por isso, só se manifesta quando o vírus está amplamente disseminado na comunidade, o que a vacinação dos adultos irá travar.
“Foram infetados 120 mil crianças e jovens em Portugal e, no Dona Estefânia, só houve 34 casos de MIS-C”, contabiliza. A solução para evitar estes casos poderia ser a vacinação daqueles que fossem identificados como pertencendo a grupos de risco.
Contudo, Maria João Brito admite que, “nesta altura, ainda não é possível identificar grupos de risco para o SARS-CoV-2 nos mais novos porque algumas complicações acontecem em crianças saudáveis.”
O especialista em Saúde Pública Bernardo Gomes teme que as novas variantes do vírus possam ser sinónimo de maior infecciosidade das crianças que, até agora, “foram menos tocadas pela doença”.
O médico acredita que os mais novos poderão “desempenhar um papel importante no bloqueio da transmissão comunitária do vírus”. No entanto, não tem dúvidas de que a prioridade na vacinação deve continuar a ser dada aos mais velhos e aos mais vulneráveis.
E, neste sentido, considera até mais importante vacinar os professores do que os alunos, uma vez que as crianças desempenham um papel menos importante na transmissão do SARS-CoV-2 do que os adultos.
Tudo indica que os mais novos só serão vacinados depois de os adultos estarem imunizados, mas questiona-se até que ponto serão fundamentais para atingir a tão desejada imunidade de grupo que, em Portugal, deverá implicar que 70% da população tenha anticorpos.
Bernardo Gomes não acredita que comecem a vacinar-se crianças e jovens antes do final deste ano. Até lá, aguardam-se mais conclusões da investigação científica.