Os alimentos desperdiçados no planeta podiam alimentar quase mil milhões de pessoas. O combate ao desperdício é, por isso, tanto uma luta moral como ambiental. Têm-se multiplicado as iniciativas de reaproveitamento de produtos, para evitar que acabem no lixo, e muitas empresas estão a fazer a parte que lhes compete nesse caminho.
Por exemplo, as bananas, como amadurecem rapidamente, são dos produtos que mais se desperdiçam nos supermercados. Como resolver o problema? “Há uma quebra elevada, e o que nos dá mais pena é que as bananas, quanto mais maduras estão, mais doces são”, lamenta Rita Cruz, da Gestão de Projetos de Sustentabilidade da Auchan, na conversa da VISÃO VERDE desta semana. “E daí lembrámo-nos de fazer um bolo de banana vegan: um projeto de economia circular em que a banana é retirada de venda, quando já está com um tom mais escuro por fora e o consumidor não compra, e é utilizada para fazer bolos.” Desde que a iniciativa arrancou, no final do ano passado, foram aproveitados 700 quilos de banana, que de outra forma iriam parar ao lixo.
Há outro exemplo com um produto que fica quase sem valor comercial de um dia para o outro. “Vendemos o pão do dia anterior, que pode ser utilizado para culinária, a um preço muito mais baixo. E quando não é vendido, fazemos pão ralado.”
A empresa tem também um acordo com a app antidesperdício Too Good To Go para criar cabazes com alimentos que se estão a aproximar do fim da validade. “Disponibilizamos estas magic boxes em 34 hipermercados e 29 lojas de proximidade. É uma iniciativa que já nos permitiu salvar 60 mil refeições e evitar a emissão de 150 toneladas de CO2 equivalente.”
Uma questão de sobrevivência
A economia circular, lembra Rita Cruz, pode ter dois sentidos: o consumidor e o produtor. “No nosso projeto de desperdício zero, fizemos parcerias com produtores locais, que vão às nossas lojas entregar os produtos frescos e levantam as borras de café das nossas cafetarias, que depois são usadas como fertilizantes de solos e repelentes de pragas. Sai assim um produto da nossa atividade, que era um resíduo, e retorna à nossa loja como hortícola.”
Do ponto de vista logístico, os projetos são simples. Mais complicada é a questão fiscal, diz. “A nossa economia ainda não está preparada para estes produtos de economia circular. Às vezes, é mais fácil, infelizmente, enviar para resíduo do que aproveitar os produtos. Ainda nos deparamos com dificuldades fiscais. O problema é que temos de pagar o IVA dos produtos, e o resíduo não paga IVA. Temos de explicar que este produto vai pagar IVA sobre a forma de outro tipo de produto. E não é fácil explicar isto. Mas a legislação está a evoluir. O nosso país terá de se adaptar, porque não podemos dar-nos ao luxo de pôr comida no lixo.”
Ultrapassadas as barreiras fiscais, reduzir o desperdício faz sentido económico. “Quando tenho um produto pago aos nossos produtores que depois não é vendido, isso tem um impacto ambiental e económico. Tal como a energia: toda a energia que desperdiçamos é paga.”
Para uma empresa, é uma questão de sobrevivência, num mundo em mudança. “Vamos mesmo ter de mudar os nossos comportamentos. As empresas que não se adaptarem vão morrer.”
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