A Terra. O Planeta Azul que celebramos a 22 de abril, desde 1970, pelas mãos do senador americano Gaylord Nelson (1916-2005), através de um fórum ambiental que envolveu cerca de 20 milhões de participantes, e que foi, entretanto, aprovado pelas Nações Unidas, em 2009, como o Dia Internacional da Mãe Terra, com o compromisso de proteger e a necessidade de preservar os recursos naturais, o ambiente e a sustentabilidade do planeta.
No entanto, é importante dizer que esta nossa Casa Comum, sem o conjunto de sistemas associado, como o sistema climático terrestre, não seria possível ter vida. A época do holoceno, com mais de 11 mil anos, foi o maior período da história da humanidade em que tivemos um sistema climático estável. Hoje estamos no antropoceno e pela primeira vez na história da terra, existe uma espécie, a Humanidade, que pela sua atividade, está a alterar esta estabilidade que tem permitido a coexistência de milhões de outras espécies no Planeta em perfeito equilíbrio. Um ecocídio, portanto.
Em 2021, várias organizações sugeriram que o Covid-19 era uma mensagem de aviso do planeta para a Humanidade, como se não tivessem bastado as catástrofes climáticas como afirmações da natureza, com milhões de perdas de vidas e de prejuízos materiais. Ainda assim, em 2022, vimos chegar à europa uma guerra que deixará marcas gravíssimas e com a qual não imaginávamos ter de lidar novamente.
A Europa vivia um clima de paz bélica há 65 anos1, que foi essencial para permitir um progresso económico e um desenvolvimento social, mas também uma evolução na proteção do ambiente e na conservação da natureza, para além das conquistas essenciais nos direitos humanos e nos índices de qualidade de vida.
Assim, a somar às crises pandémicas, económicas, financeiras e energéticas, temos agora uma crise de paz, que agrava ainda mais o contexto atual. No entanto, mesmo que consigamos resolver todas as crises referidas, não podemos esquecer aquelas que permanecerão nas nossas vidas por longas décadas e que precisam de uma ação urgente. São elas as crises climáticas, de biodiversidade e de recursos, e que nos podem levar à extinção.
O contributo do terceiro grupo para o sexto relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC), divulgado a 4 de abril na área da mitigação às alterações climáticas, foi perentório em afirmar que é “agora ou nunca”. As emissões de gases com efeito de estufa continuam a crescer, ainda que num crescimento mais lento. Ainda assim, apontam o caminho da esperança ao direcionar um conjunto de soluções em áreas onde é preciso apostar mais como na construção, na energia, na indústria, na alimentação, na agricultura, na floresta e outros usos do solo.
Em 1970, a 1 de janeiro, o Presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, assinava o primeiro diploma de uma Lei Nacional de Política Ambiental, dando origem a uma sequência de legislação, para a avaliação ambiental e proteção da natureza. Mas, foi em 1972, que se deu a Conferência de Estocolmo – a primeira reunião à escala global e precursora de outras duas – centrada na necessidade de resolver problemáticas ambientais, que ocorreram após o impacto económico do período pós Segunda Guerra Mundial. Mesmo que não tenha apresentado um coletivo de resoluções e acordos concretos, este encontro de Estocolmo teve o condão de provocar uma explosão de legislação ambiental e os consequentes convénios internacionais adstritos a esta temática, bem como introduzir como indispensável, a sensibilização e educação ambiental da população e a aposta clara na investigação científica. Teve ainda a virtude de exaltar a intervenção mais extraordinária, acutilante, inspiradora e ainda atual de Olof Palme2, que vale a pena rever, em que afirmou ser necessária uma firme resposta global para a crescente crise ambiental. Nesse mesmo ano, procedeu-se à criação de uma lógica programática denominada United Nations Environment Programme (UNEP), de onde saiu o conceito de ecodesenvolvimento, criado pela personalidade de Ignacy Sachs – o primeiro ecossocioeconomista – que combinou o crescimento económico, o aumento equitativo do bem-estar social e a preservação ambiental. O ecodesenvolvimento, anos depois, daria origem ao conceito de desenvolvimento sustentável.
Passados todos estes anos, em 2022, num ano singular em que celebramos 150 anos do dia mundial da árvore, 50 anos do dia internacional da floresta, 30 anos do dia mundial da água e 50 anos depois da referida primeira grande conferência ambiental global, continuamos a ouvir alertas, sem ações concretas que tragam resultados promissores.
Há 25 anos participei na criação do Movimento Parque Verde, na Figueira da Foz. Tudo começou com a defesa da zona arborizada do Parque de Campismo, com a entrega de uma petição subscrita por 4223 cidadãos, na Câmara Municipal da Figueira da Foz, em que vários deles, de forma descomprometida e abnegada, deram o “corpo às balas”. Desde aí, até hoje, o Movimento Parque Verde não parou, travando várias lutas associadas à manutenção de espaços e corredores verdes, como na revisão do PDM e manutenção dos projetos delineados pelos Arquitectos Gonçalo Ribeiro Telles e Alberto Pessoa.
Hoje, pelos mesmos princípios, mas com um impacto global, vejo-me a subscrever a Declaração de Estocolmo. Uma iniciativa da sociedade civil e da comunidade científica, a fim de ser agendada e discutida, na Conferência de Estocolmo +50, a ter lugar em junho, uma proposta que revolucionará o direito internacional e que vem desafiar os Estados, a partir das Nações Unidas, a estabelecer o sistema Climático Terrestre como um bem comum da Humanidade. A declaração, que convido a ler e a subscrever, assenta em 4 passos: Implementar o direito a um ambiente saudável; reconhecer, restaurar e salvaguardar os bens comuns globais; construir uma economia regenerativa; e priorizar a governação e soluções institucionais.
Em 2022 faz também 10 anos que comemoramos o Dia Internacional da Felicidade, aprovado por unanimidade pelos 193 estados-membros das Nações Unidas, defendendo a busca pela felicidade como um objetivo humano fundamental. A felicidade das pessoas, a par da identidade dos territórios, é a quinta dimensão do conceito de desenvolvimento sustentável apresentado por Lucas Seghezzo (2009). A variação do bem-estar está relacionada com 42% dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, ligados às áreas da economia, indústria, infraestruturas, consumo, trabalho, saúde e energia. Apesar disso, o World Hapiness Report tem demonstrado cientificamente, a relação da felicidade e do bem-estar humano com os aspetos da qualidade do ambiente e do desenvolvimento sustentável, quer ao nível global, quer ao nível das cidades, demonstrando que é possível medir a felicidade e o bem-estar, em correlação com outros indicadores.
Perante uma guerra na Europa, faz cada vez mais sentido que nos possamos unir em torno de um denominador comum, o respeito pela natureza, não só como garante de um serviço de ecossistema prestado à Humanidade, mas também como uma condição essencial para uma felicidade coletiva e uma saúde e paz planetárias.
“The air we breathe is not the property of any one nation – we share it. The big oceans are not divided by national frontiers – they are our common property. What is asked of us is not relinquish our national sovereignty but to use it to safeguard our common property, to leave something for us and future generations to share. If we manage our own national environment in a sensible way we are not only contributing to well-being of our own people, we are giving proof of international solidarity. This simple fact is giving a new dimension to the concept of national sovereignty, and to the common work of peace. In the field of human environment there is no individual future, neither for human beings nor for nations. Our future is common. We must share it together. We must shape it together.”
Olof Palme (6th June, 1972, in UN Conference on the Human Environment)
1 Tratado de Roma, de 25 de março de 1957.
2 Olof Palme foi por duas vezes Primeiro-Ministro da Suécia, entre 1969 e 1976 e entre 1982 e 1986, sendo neste último assassinado à saída de um cinema.