Comprar casa tem-se transformado num projeto de vida ambicioso que infelizmente muitos jovens já só conseguem alcançar numa fase mais avançada da vida. O acesso ao crédito, a capacidade de suportar o valor de entrada, a maturidade para compreender o setor e a sua avaliação, assim como o tempo e dinheiro associados aos processos burocráticos, são alguns dos principais entraves de uma geração que se mantém em casa dos pais, ou com o apoio da família, até cada vez mais tarde.
O cenário complica-se quando repentinamente as regras para a concessão de empréstimos se alteram, com inúmeros jovens que já ultrapassaram os 30 anos – e que finalmente conseguiriam nessa fase ter autonomia financeira suficiente para comprar uma casa – a verem as condições de acesso a uma nova casa piorarem significativamente. Segundo o Banco de Portugal, o objetivo destas medidas é acelerar a convergência dos créditos habitação para os 30 anos de maturidade, sendo que, em dezembro de 2021, a maturidade média era de 32,6 anos. Porém, não estando ao nosso alcance mudar as regras, como podemos então atuar para dinamizar este setor e apoiar o acesso à habitação?
Comecemos por analisar a origem de todos os entraves: o preço das casas. Nos últimos anos, Lisboa tem estado sob os holofotes de muitos investidores estrangeiros. A sua qualidade e custo de vida, a atratividade para empresas, trabalhadores, e famílias a nível global, fazem da nossa capital um destino perfeito para investir em imobiliário. Paralelamente, também se observa uma preferência dos portugueses pela compra de casa, em detrimento do arrendamento, tornando-se mais atrativo adquirir um imóvel próprio devido ao elevado valor das rendas. Esta tendência está bem identificada no relatório “Housing in 2021” da Eurostat, que indica que 77,3% dos portugueses detém habitação própria. Além disso, em 2021 foram concedidos 15 mil milhões de euros em empréstimos para compra de casa, sendo este o valor mais alto desde 2007. Esta procura elevada traz consigo um inevitável aumento do preço das casas, suportado essencialmente pela lei da oferta e da procura (com a procura a superar a oferta). Neste contexto, não é surpreendente que em novembro de 2021 a Comissão Europeia tenha revelado dados que demonstram que Portugal é o sexto país da União Europeia onde existe atualmente maior sobrevalorização dos preços das casas.
Com base nestes dados, a única forma de equilibrar a balança para os portugueses, que, geralmente, têm menor capacidade de compra do que os investidores estrangeiros, será garantir uma avaliação justa e factual do nosso parque imobiliário. Assim, torna-se cada vez mais importante que compradores, vendedores e outros agentes do setor tomem as suas decisões com base em avaliações sérias e rigorosas, utilizando critérios objetivos como a localização, a idade do edifício, o estado do imóvel, a sua eficiência energética, entre outros. A alteração dos mecanismos de avaliação permitirá trazer mais transparência para o setor e torná-lo acessível às famílias locais. Contudo, a principal dificuldade ainda reside na obtenção e tratamento de dados para suportar avaliações independentes e imparciais.
É neste contexto que a tecnologia surge como fator chave para melhorar o setor, já que permite analisar cada critério sem influência de conflitos de interesses, da ambição do proprietário, de estratégias especulativas ou outros fatores subjetivos e emocionais. Por este motivo, é cada vez mais importante que surjam alternativas inovadoras e que compradores, vendedores e outros players do setor adiram à sua utilização. Apenas com o apoio da tecnologia poderemos acelerar a democratização do acesso à habitação e a estabilização dos valores de mercado.