Primeiro foi o jornal Folha de São Paulo, o maior do Brasil, com uma circulação a rondar os 300 mil exemplares diários e mais de 8 milhões de seguidores na rede social criada por Mark Zuckerberg. O anúncio, feito no site da própria publicação, explicava que a estratégia seguida pelo Facebook de privilegiar as relações entre ‘amigos’ em detrimento das publicações de sites como os jornais, deixava a Folha numa situação em que seria impossível continuar: esta opção levará a que o algoritmo desenvolvido pelo Facebook fomente a criação de bolhas de opinião, uma vez que as pessoas terão acesso privilegiado a ideias que vão ao encontro às suas, sem promover o debate salutar e honesto.
“Isso reforça a tendência do utilizador de consumir cada vez mais conteúdo com o qual tem afinidade, favorecendo a criação de bolhas de opiniões e convicções e a propagação das fake news”, lê-se no comunicado do jornal, que anunciou que deixaria de alimentar o seu perfil na rede, embora não o fosse apagar.
Em entrevista à edição brasileira do jornal El País, o diretor da Folha de São Paulo, Sérgio Dávila, esclareceu pouco tempo depois que “a Folha acha que conteúdo de qualidade tem de ser remunerado; que o utilizador deve ser exposto a opiniões contraditórias; que o noticiário deve seguir os parâmetros do jornalismo profissional antes de ser divulgado”. E rematou: “O Facebook parece não levar em conta nada disso”. Portanto, a Folha vai continuar a apostar nas restantes formas de divulgação dos seus trabalhos. Aliás, a publicação esclarece que nos últimos meses, a quantidade de leitores que chegava através do Facebook caíra significativamente, o que só deu força para a tomada da decisão.
Apesar de ainda não ter havido mais anúncios de meios de comunicação informativa a seguir a tendência, a verdade é que a Folha lançou a discussão em termos globais, e é possível que haja quem a acompanhe em breve. Ou pelo menos, que repense a estratégia.
Publicidade acompanha
Mas não são só os meios de comunicação que decidiram abandonar Zuckerberg e fazer disso um statement. Esta semana, o Diretor de Marketing da Unilever, Keith Weed, anunciou que a empresa está a ponderar abandonar tanto o Facebook quanto a Google. Com um orçamento para publicidade digital que ronda os 2 mil milhões de euros ano, a companhia é o segundo maior anunciante mundial – só fica atrás da Procter & Gamble – e se se retirar das redes pode provocar um rombo que Zuzkerberg sinta mais rapidamente que o da saída da Folha. Mas para Weed, a questão é clara: “Não podemos continuar a apoiar uma cadeia de fornecedores digitais, que distribui mais de um quarto da nossa publicidade dirigida aos consumidores e que, normalmente, é tão transparente quanto um pântano”.
Numa conferência na Califórnia, o representante da multinacional que detém marcas como a Dove, Magnum ou Persil sublinhou ainda que “é do interesse da indústria digital entender o que se passa e atuar em conformidade. Antes que os utilizadores deixem de ver, os anunciantes deixem de anunciar e os editores parem de publicar.
Paul Frampton, antigo responsável de marketing para a região francesa do grupo gigante publicitário Havas realçou ao The Guardian a importância deste aviso da Unilever, classificando-o como um momento crucial para a definição dos próximos tempos: “Há um descontentamento crescente sobre as plataformas digitais entre os marketeers”, afirmou ao jornal britânico. “Tal como aconteceu com o #MeToo, parece que este é um movimento que rebentou e que o facto de [Keith] Weed tê-lo afirmado vai significar que muitos outros poderão acompanhá-lo” nesta crítica.