Se não soubéssemos que esta é a sua primeira encenação, nada nos levaria a desconfiar. Vemo-lo no ensaio com o à-vontade de quem nasceu para fazer teatro, independentemente do lugar que ocupa na ficha artística. Para Albano Jerónimo, essa organicidade é fruto da sua relação “muito aberta” com encenadores, realizadores e atores. Embora seja um novo desafio, dirigir tornou-se sobretudo “uma extensão” natural desse trabalho enquanto ator e da sua paixão pelo teatro, diz. John Romão espicaçou-o e ele respondeu à chamada.
Um Libreto para Ficarem em Casa Seus Anormais cruza dois imaginários aparentemente distantes: o texto do dramaturgo hispano-argentino Rodrigo García (Tivessem Ficado em Casa, Seus Anormais) e o filme Fitzcarraldo, de Werner Herzog, sobre um alemão melómano que tem o sonho de construir um Teatro de Ópera na Amazónia. A partir daí, Albano Jerónimo criou a sua própria ficção, desempenhando o papel de um Fitzcarraldo que é contratado para montar uma ópera em Portugal, no Teatro Nacional D. Maria II – “com os recursos que há”, sublinha.
A peça constrói-se através de um jogo irónico e perverso, entre a pulsão colonizadora de Fitzcarraldo e uma certa exortação revolucionária, associada ao próprio ato criativo. “Ele vem para evangelizar esta massa de pessoas através da música do homem branco, mas falha nessa missão”, explica o ator. “Essa evangelização traz também uma instigação à revolta, através da arte.” Mas terá alguém o direito de dizer contra o quê e quem deve um povo revoltar-se? A resposta vem no final. E é absolutamente hilariante.
Um Libreto para Ficarem em Casa Seus Anormais > Teatro Nacional D. Maria II > Pç. D. Pedro IV, Lisboa > T. 21 325 0800 > até 2 jul, qua 19h30, qui-sáb 21h30, dom 16h30 > €6, €12