As roupas e o penteado mostram uma mulher diferente, menos amedrontada, mais segura. Mas, sete anos depois do início, a situação não é muito diferente. Alicia termina de pé, ao lado do marido, Peter Florrick, quando este tenta desculpar-se airosamente de mais um escândalo político. Só que desta vez quando ele vai pegar-lhe na mão, a advogada foge em busca do seu novo amor… E este não estava lá.
Em vez disso, Alicia enfrenta uma sócia em fúria, Diane Lockhart, por ter impugnado o marido desta em tribunal para tentar retirar as acusações de corrupção que recaem sobre Peter. É neste momento que Alicia leva uma estalada e não chora. “Ver Diane a esbofetear Alicia foi particularmente doloroso. Sugere que o marido de Diane realmente a traiu e a verdade tornou-se pública em tribunal, onde Kurt não podia mentir. Alicia tinha, basicamente, tornado Diane numa Alicia”, escreveu Emily Nussbaum, na critica de televisão da revista The New Yorker.
Este momento remete para a estalada que Alicia deu a Peter logo no primeiro episódio. Quantos espectadores ainda se lembram disso? “Durante cinco temporadas, a série foi uma das mais ricas e mais ousadas da televisão: explorando por camadas a tensão moderna entre a vida pública e a privada; sendo pioneira no que diz respeito à tecnologia; e, ao mais alto nível, com uma espirituosa e provocativa meditação sobre o fenómeno do poderoso casal político”, analisou Emily Nussbaum.
A atriz Julianna Margulies, vencedora de um Globo de Ouro, dois Emmy e uma estrela no Passeio da Fama, em Hollywood, ficou “satisfeita, animada e triste” com o final, enquanto Cush Jumbo (Lucca Quinn) preferiu os adjetivos “feliz, sexy e triste”. Os criadores da série, o casal Michelle e Robert King, foram mais práticos: “É o final, infelizmente”. “O final tem de ser inevitável e surpreendente e as duas coisas são muitos difíceis de conseguir ao mesmo tempo”. Eles preferiam que o final fosse mais ambíguo, como os livros de Milan Kundera que tanto influenciaram a forma de escrever esta série. Mas sobretudo quiseram que o final fosse ao gosto dos seus atores, especialmente de Julianna Margulies. “Acabamos a série porque realmente tinha de acabar, porque a escrevemos assim.”
Para muitos o anúncio do spin-off pode servir como placebo. A cadeia generalista CBS já disse que produzirá uma série protagonizada com as personagens de Diane Lockhart (Christine Baranski) e Lucca Quinn (Cush Jumbo). Com estreia programada para a primavera de 2017, precisamente um ano depois do fim das sete temporadas da série original, Michelle e Robert King escreveram o primeiro episódio, mas não serão os produtores da série.
Numa carta aberta aos fãs, a dupla criativa diz que “a Alicia com que começámos tem muito pouco a ver com a que diz adeus”. Também esperam ter contribuído para mudar a forma como se vê a mulher na televisão. “Para que se veja a mulher de uma forma mais completa”, afirmaram ao jornal El Pais. Michelle e Robert King gostavam de acreditar que a série demonstrou que as mulheres podem ser protagonistas sem serem super-heróis, nem serem como os homens. “Pelo contrário, podem ser anti-heróis, podem ser completas, podem ficar com raiva, podem tomar decisões morais questionáveis, inclusive como Alicia, erróneas. E mesmo assim, o público estará com elas sem necessidade de as idolatrar.”
Ao longo de sete anos, o enredo foi mostrando uma mulher que envelheceu, e amadureceu, ficou mais segura, mais independente, prestes a divorciar-se e a ir à luta por um novo amor… caso o encontrasse. Uma advogada que construiu uma carreira capaz de grandes feitos, especialmente em tribunal onde tantas vezes os casos apresentados se confundiam com a atualidade: o início é semelhante ao escândalo de Eliot Spitzer, que teve de demitir-se do cargo de governador de Nova Iorque, em 2008, devido a um escândalo sexual semelhante ao da personagem de Chris Noth (ainda – e para sempre – Mr. Big de O Sexo e a Cidade); um caso de agressão sexual, alegadamente, como o de Al Gore; as escutas telefónicas da NSA, a lembrar as denúncias de Edward Snowden; os processos tecnológicos associados ao racismo como o da Google, que foi acusada de etiquetar fotografias de pessoas afro-americanas como gorilas, entre outros temas.
E mesmo sabendo que não haverá mais episódios, mantém-se a expetativa sobre o que poderia acontecer a Alicia Florrick: candidatar-se novamente a um cargo político assessorada por Eli Gold, criar uma empresa com Lucca Quinn ou juntar-se a Louis Canning, transformando-se numa advogada fria e calculista.