Se dúvidas houvesse que as mudanças climáticas estão aí, o calor abrasador para um dia de março que se fazia sentir na Praça do Bocage, em Setúbal, não deixava margem para dúvidas. O clima está mesmo mudar.
As centenas de pessoas que ali se reuniram tinham idades muito diferentes: desde o 4ºano da Escola da Quinta do Anjo, Palmela, até mães (muito poucas) que acompanhavam os filhos e professores. A preocupação com as alterações climáticas parece reunir, além de diferentes faixas etárias, vários estratos sociais. Da St Peter’s School, um colégio particular cujo ensino é feito em inglês, estavam presentes muitos alunos, que empunhavam, alguns deles, cartazes em inglês. «Viemos alunos de todos os anos representar a escola», conta uma rapariga, «e ainda vão chegar mais, que não puderam vir antes porque tiveram teste de Matemática.» Misturavam-se com os alunos das escolas públicas de Setúbal, as fardas verdes e alinhadas do colégio com as calças de ganga esburacadas e os ténis.
«A s’tora disse-me: vou ter que te marcar falta. E eu respondi: ok!», conta uma rapariga de t-shirt e cabelo comprido à amiga. À sua volta há dezenas de dezenas de cartazes, feitos com restos de caixotes de papelão, revelando que esta gente não é adepta do desperdício. O lado interior de uma caixa de uma fritadeira elétrica sem óleo serve agora para albergar a frase «It’s our future.»
Por perto, está outro cartaz que resumirá, provavelmente, o sentimento da maior parte destas crianças e adolescentes: «Faltei a História para fazer História.»
A manifestação começara à volta da estátua de Bocage, com Margarida Marques e Rafaela Bubes, ambas de 16 anos e estudantes do 11.º ano de Humanidades (mas numa na Escola Sebastião da Gama, a outra na Secundária do Bocage) de megafone na mão, explicando porque estavam ali. «Queremos ter um planeta onde viver em 2050», diz Margarida. «Eu não devia estar com medo do futuro», acrescenta Rafaela. «Vamos fazer barulho, vamos ser ouvidos!»
E lançam a primeira palavra de ordem: «O que é nós queremos mudar?» «Mudar o sistema!» «E porquê?» «Porque não há Planeta B!»
O protesto muda-se para a porta da Câmara Municipal. São umas centenas largas de pessoas, há dezenas e dezenas de cartazes (veja a galeria de imagens), com frases significativas: «Eco>Ego»; «Aborrecido? Fala sobre o clima»; «O Planeta está a morrer e os governos só a ver»; «45ºc graus é normal para o governo?!»; «Vejo tantos humanos e tão pouca humanidade»; «What I stand for is what I stand on»; «Não desperdicem bons planetas, são dificeis de encontrar».
Há cartazes e palavras de ordem que dizem diretamente respeito a Setúbal. O desenho de um golfinho (há golfinhos no rio Sado, que banha Setúbal) com a frase «Preciso de ajuda». Um poster colorido onde se lê «Não é só o choco de Setúbal que está frito». E grita-se, volta e meia, «Dragagens, dragagens/não podem fazer/ têm uma reserva para proteger».
Mas a palavra de ordem que mais entusiasmo e energia, a seguir à «Ó sr. ministro, diga-nos por favor, porque é que no inverno ainda faz calor!», é lançada pelos mais pequenos, a turma de 4º ano que veio da Quinta do Anjo, em Palmela, de transportes públicas até Setúbal, para participar na manifestação. Os seus cartazes são em folhas A4. Entram para a cabeça da roda, ou seja, para o sítio onde estão as organizadoras da manifestação. E, pouco depois, começam a gritar a palavra de ordem que inventaram no caminho até ali, eles que poucos dias antes tinham estado a falar do 25 de Abril no ATL: «As crianças unidas jamais serão vencidas!»