Olhando para as motas alinhadas na pista de corrida, os pilotos que estão sentados em cima delas parecem todos iguais. Têm todos entre 10 e 14 anos e estão vestidos com fatos acolchoados, botas altas, luvas e capacete. Estão muito concentrados, esperando pelo sinal de partida para mais uma prova do Campeonato Nacional de Velocidade na categoria Júnior. Apesar de serem tão novos que ainda nem sequer podem conduzir uma moto na estrada, ali, nas corridas, alguns deles chegam a atingir 180 km por hora.
Deles todos, há um piloto que consegue andar mais depressa do que os outros, e por isso vai à frente no Campeonato Nacional. Se olharmos com atenção, identificamo-lo facilmente: debaixo do seu capacete sai uma bonita trança preta. É que Bruna Lopes é a única rapariga a competir nesta categoria, não só em Portugal como em Espanha, onde também corre no Campeonato Nacional.
Em 2014, Bruna foi vice-campeã e este ano já está em primeiro lugar no Campeonato Nacional (faltam ainda mais três corridas). Em Espanha, está em 10.º lugar (entre 35 pilotos). «Andar de mota é uma emoção indescritível», diz-nos antes da prova no Autódromo Internacional do Algarve, em Portimão.
Por Bruna ser menina, o seu pai (que é mecânico de motas) nunca pensou que um dia ela quisesse entrar em corridas. Apenas esperava que talvez, com sorte, ela quisesse ir de mota para a escola. Bruna recebeu motas de brincar desde os 2 anos e lembra-se de aos 6 adorar acelerar: «Deixava-me feliz! » Também se recorda de chorar quando o pai saía de mota e não a levava. Aos 9 anos, começou a pedir motas mais «a sério». «Queria que andassem mais», diz. «Via o meu pai e queria acelerar como ele», recorda.
«Mas a ideia de competir foi só dela», garante a mãe, que, tal como o pai, faz parte da equipa que a treina. Bruna confirma: «Via muitas corridas na internet e aquilo mexia comigo. Queria experimentar e comecei a pedir aos meus pais», conta. «Concordámos mais por graça, nunca pensando que chegasse onde já chegou», diz a mãe.
Bruna tinha apenas 11 anos quando competiu pela primeira vez. Vive em Bragança, Trás-os-Montes, a mais de 200 km da pista mais próxima, que fica em Braga. «Por isso, não posso treinar tantas vezes como gostaria», lamenta. «Mas tenho muito cuidado com a alimentação e faço treino específico no ginásio para aumentar a minha resistência física», conta.
«Em Espanha, os meus adversários têm treinos regulares e vão conhecer os circuitos mais de uma semana antes das corridas. Eu só posso chegar na véspera…» Por um lado, porque evita faltar à escola, por outro, porque mais dias implicam mais despesas para os pais.
Apesar de volta e meia falhar as aulas, Bruna garante que a escola é uma prioridade: «Faço questão de ter boas notas!» Passou para o 8.º ano e as suas disciplinas preferidas são Matemática e Ciências. «Quero tirar um curso – ainda não sei qual – e ter uma profissão, porque sei que não posso contar só com o motociclismo.»
Nem o facto de já ter caído demove Bruna de continuar a correr. «Na primeira corrida em Espanha, não fiz uma curva, fui em frente e caí. Fiquei com uma lesão no baço que demorou três meses a curar. Não me lembro da queda, porque desmaiei», conta. Ainda assim, pedia aos médicos para sair do hospital e participar na prova seguinte. «Queria mostrar que podia vencer o medo», diz. «Todos os desportos de competição são perigosos, este não é mais nem menos», remata Bruna. «Quisemos que desistisse, mas não conseguimos», conta a mãe. «É o sonho dela.»
Quem parte em primeiro e último?
Como em todas as corridas, ganha o mais rápido. Mas não é assim tão simples. Primeiro, há os treinos livres e depois os cronometrados. Os tempos que os pilotos fazem nestes últimos determinam em que lugar vão posicionar-se na grelha de partida. Ou seja, quanto mais rápidos forem, mais à frente estarão na partida e mais vantagem terão sobre os outros. Os pilotos só podem partir quando o semáforo na grelha de partida se apaga. Se arrancarem antes, são penalizados, tendo de parar na box (oficina). Sem idade para tirar a carta de condução, Bruna tem uma licença desportiva especial: «Só posso andar de mota em pista. E às vezes passam-se duas semanas sem treinar. Fico ansiosa!»
Texto: Ana Esteves
Fotos: Filipe Farinha/Agência Stills