Formou-se em Nutrição e doutorou-se em Neurociências pela Universidade Federal de Santa Catarina, no Sul do Brasil, mas a fitoterapia e a fisiologia do exercício também estão no seu leque de interesses e de intervenção. Bettina Moritz não se cansa de lembrar, a quem a procura, que a chave para uma boa saúde física, psicológica e sexual está na avaliação das deficiências nutricionais e na reposição de vitaminas e minerais presentes nos alimentos e nos suplementos. Este ano, Bettina voltou a Portugal e passou o seu 41º aniversário no Congresso Europeu de Nutrição, que aconteceu na semana passada, em Lisboa, no qual falou da influência da nutrição na libido. Em conversa com a VISÃO, deu pistas sobre o que podemos colocar no prato para uma vida sexual mais plena.
De que falamos quando nos referimos a alimentos afrodisíacos?
São todos aqueles que têm o poder de alimentar o desejo sexual, mas ainda são muito questionáveis, na medida em que para obter os benefícios que se lhes atribui é preciso um consumo elevado e frequente. Porém, uma alimentação natural, rica em fruta e vegetais com flavonoides, com funções antioxidantes e anti-inflamatórias, oferece ganhos nesse campo.
Se é possível influenciar a libido através da alimentação, quais os alimentos que estão no top?
O gengibre, o mel, a romã, o cebolinho (ou cebolinha-chinesa) e a melancia potenciam o efeito afrodisíaco. A melancia fornece um alto teor de ornitina (aminoácido), que se transforma em arginina, associada ao aumento da ereção. São precisos dois copos de sumo diários na dieta, mas o mesmo efeito pode ser obtido através de um composto de marapuama, gengibre, 500 miligramas de guaraná em pó e 1 600 miligramas de arginina.
Há contraindicações em tomar este suplemento alimentar (de venda livre)?
A única coisa a considerar é quando existem enxaquecas,que podem agravar-se um pouco com a toma de arginina. Por outro lado, há um estudo europeu sobre ereção e satisfação sexual que mostrou que a toma de antioxidantes associada à de medicamentos como o Viagra tinha melhores resultados do que apenas o fármaco.
Outros ingredientes a ter no menu para nutrir o desejo e conseguir satisfazê-lo?
Um estudo longitudinal com 25 096 homens, publicado em 2016, mostrou que quem fazia uma dieta rica em flavonoides tinha menos riscos de disfunção erétil. Os flavonoides são amigos da ereção e estão presentes na geleia real (ou pólen, própolis e mel) e em cinco alimentos: pera, morango, maçã, mirtilo e vinho. Outros nutrientes que promovem a satisfação sexual: a vitamina B6, que existe na batata, no arroz e na abóbora, e certos minerais. Caso do zinco, presente nas ostras e em oleaginosas como castanhas, nozes, amêndoas, pistácios, macadâmias e sementes de girassol, e do boro, disponível nas lentilhas, nas maçãs e nas uvas.
De que forma a dieta pode ajudar a reduzir efeitos negativos de certos fármacos na libido?
Os inibidores seletivos da recaptação da serotonina (SSRI), que são antidepressivos, comprometem essa área. A marapuama (Ptychopetalum olacoides), da Amazónia, e o feno-grego (Trigonella foenum-graecum) são plantas medicinais com efeito afrodisíaco que melhoram o desempenho sexual, mas não igualam o do fármaco.
Há riscos para a saúde em tomar hipericão (Hypericum perforatum) para a depressão e, ao mesmo tempo, os fármacos prescritos pelo médico para esse fim sem o informar disso?
A planta tem um efeito parecido com o dos SSRI (antidepressivos) e não deve ser usada em conjunto com eles.
Que tipo de pacientes recebe na sua clínica, em Florianópolis?
Atendo muitos casos de infertilidade, de menopausa e de infeções vaginais, uma procura que é fruto das minhas aulas e palestras sobre a saúde da mulher.
Há soluções para voltar a ter desejo após ser mãe?
É um facto que os níveis de prolactina alteram significativamente os níveis de testosterona e, consequentemente, do desejo da mulher. Sendo a prolactina essencial nesse período, é esperado que haja essa quebra.
As isoflavonas de soja são úteis na menopausa? Há médicos que defendem a terapia hormonal de substituição face a soluções naturais, nem sempre inócuas.
É importante apurar se são orgânicas ou transgénicas. Os estudos mostram que as isoflavonas de soja têm um efeito favorável no sistema nervoso central, sem o risco de cancro de mama associado à terapia de substituição hormonal mas, caso já tenham tido a doença, é desaconselhado o seu consumo. É preciso uma avaliação bioquímica individualizada antes de avançar para a fitoterapia e ter em conta possíveis interações com fármacos que a pessoa também esteja a tomar. E atenção: o consumo exagerado de soja não é bom para o desempenho sexual masculino. Um jovem vegan ficou sem libido e sem ereção desde que passou a consumir 360 miligramas diários de isoflavonas de soja. Só as recuperou quando retirou a soja da dieta, revelou o estudo de caso (publicado no jornal Nutrition, 2011).
Onde podemos encontrar a dopamina, associada ao sistema de recompensa no cérebro?
Desconheço estudos com alimentos que aumentem os níveis desse neurotransmissor. Este ano foram conhecidos os resultados de uma investigação que confirmou o papel da dopamina na produção de testosterona. O seu precursor é a tirosina, aminoácido presente nas carnes e, embora não esteja provado que consumi-las aumente a libido, há dados para afirmar que os vegetarianos têm uma produção de testosterona e uma libido mais baixas. O zinco, o ferro, a vitamina B6 e o ácido fólico, o alecrim, o café e o ginseng estimulam a produção de dopamina.
Preferir carne, peixe ou nenhum dos dois faz diferença na hora de comer e melhorar a libido?
Trata-se de uma avaliação muito particular e que envolve muitos fatores. Por exemplo, as fontes de tirosina que contribuem para produzir dopamina e testosterona estão na carne e no peixe, mas se quem as consumir for obeso, ficará atrás de uma pessoa vegan que esteja em forma. Outra situação: o desejo opera-se no sistema nervoso central e, sabendo que os recetores da testosterona estão no córtex pré-frontal, é possível ter um nível de desejo adequado mesmo com níveis mais baixos de testosterona.
Porque existem mais estudos sobre a libido masculina, a ereção, a testosterona, etc.?
É verdade. A libido feminina depende dos níveis de dopamina, testosterona e estradiol mas, sobretudo, de fatores psicológicos como a segurança, a sensação de bem-estar, e talvez por ser mais complexa existam menos estudos disponíveis.
O que acontece se tivermos tudo isto à mão mas nos faltar a motivação?
Um dos fatores que complicam tudo é o stresse, mas também aí os micronutrientes podem ajudar. Na pesquisa que fiz para o meu doutoramento, com uma amostra de 385 adultos que não tomavam fármacos nem suplementos alimentares e tinham entre 22 e 46 anos, testei o papel do ácido ascórbico, ou vitamina C, na redução de sintomas ansiosos. Havia quatro grupos, a quem foram administrados, respetivamente, um grama, 200 miligramas, 50 miligramas e placebo. Registaram-se diferenças significativas na toma de um grama para aqueles que estavam na estratificação dos 25% com mais transtornos ansiosos. A vitamina C bloqueia o recetor do glutamato (N-metil D-Aspartato) associado à hiperexcitabilidade dos neurónios das pessoas ansiosas, que beneficiam em consumi-la, também pelo efeito antioxidante no sistema nervoso central.
Quais os inimigos da libido que devemos evitar à mesa ou num encontro especial?
O consumo excessivo de álcool, o tabaco e as refeições gordurosas ou muito ricas em calorias. E os fritos, pois as toxinas geradas na fritura aumentam as inflamações e contribuem para a obesidade, outra inimiga a combater.
O que pensa do porn food, que envolve criar cenas picantes, combinando sexo e alimentos apelativos e saborosos?
As pessoas andam cansadas e sem tempo para pensar em sexo. Os alimentos amigos da libido ajudam a ter bom sexo e os rituais contribuem para pensar no sexo: o ambiente, a lingerie e até os contos eróticos, sobretudo para as mulheres.