É uma das principais conclusões que saem do inquérito realizado pela Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA): 88,4% dos oficiais dos três ramos que participaram no estudo consideram que “existe uma excessiva influência do poder político nas Forças Armadas”. O modelo de escolha dos chefes do Estado-maior revela um peso relevante para o reforço dessa opinião, com 71,7% dos oficiais a considerarem que a intervenção do poder político nesse processo “corrompe” o princípio de apartidarismo a que os militares estão obrigados.
Os oficiais generais que contribuíram para o estudo, cujos resultados são apresentados este sábado, em Lisboa, são os que menos alinham na ideia de que há uma “excessiva influência” do poder político na vida militar e, mesmo entre esses, a ideia gera pouca discordância: 78% responde afirmativamente à questão. Com exceção do único cadete que participou no estudo, e que concorda com a maioria, neste ponto, os militares “subalternos” são os mais assertivos a acusar o poder político de ingerir em demasia no universo castrense – 93,8% partilham desta opinião.
Entre os 1105 inquiridos que responderam ao inquérito (num universo de mais de 1700 oficiais contactados), apenas 6,15% negam algum tipo de ingerência excessiva.
Nomeação de Chefes “corrompe” espírito da Constituição
Noutras duas questões da auscultação, este tópico é explorado em maior profundidade. Primeiro, os oficiais são conduzidos a responder se concordam com a ideia de que “a forma de escolha e nomeação dos chefes do Estado-maior, exclusivamente através de opção política, é a mais adequada”; depois, é-lhes pedida uma posição sobre se “o sistema atual” de nomeação dos chefes do Estado-maior “corrompe” o princípio apartidário a que os militares estão vinculados pelo seu estatuto.
A título de enquadramento, refira-se que, como Comandante Supremo das Forças Armadas, cabe ao Presidente da República nomear e exonerar, sob proposta do Governo, o Chefe do Estado-maior General das Forças Armadas (CEMGFA), e os Chefes de Estado-maior de cada um dos três ramos das Forças Armadas. Na prática, o primeiro-ministro propõe ao Chefe de Estado o nome para cada um dos lugares e só depois, mediante validação deste, é feita a nomeação.
Ora, podendo não se esgotar aqui as razões que fundamentam a acusação dos militares de que há uma “influência excessiva” do poder político no seio das Forças Armadas, as resposta dão algumas pistas para explicar essa conclusão. No primeiro caso (sobre a concordância com a forma de escolha dos chefes), uns esmagadores 90,1% dos militares dizem que a nomeação dos chefes pelo poder político “não” é a forma mais adequada de conduzir esse processo. E, no segundo caso (sobre a violação do princípio apartidário dos militares), 71,7% dos oficiais auscultados defendem mesmo que a intervenção do poder político nesse processo “corrompe” um valor que está consagrado na própria Constituição da República Portuguesa (onde se refere que as Forças Armadas “são rigorosamente apartidárias”).
O inquérito aos oficiais do Exército, da Marinha e da Força Aérea foi realizado entre 21 de outubro e 30 de novembro. Os objetivos dividiram-se entre, por um lado, uma tentativa de medir o pulso à recetividade dos oficiais (associados ou não da AOFA) face às propostas que a associação de oficiais tem defendido nos últimos acolhem entre os militares graduados; e, por outro lado, reunir material que permita “contruir o ‘caderno reivindicativo da AOFA para a legislatura’” que acaba de arrancar. Cerca de 45% dos militares que participaram pertencem ao Exército, 30,5% à Marinha e 24,6% à Força Aérea. Há um equilíbrio entre os oficiais na reforma (492) e no ativo (472), tendo ainda participado militares na reserva fora da efetividade (76), na efetividade (47) e abatidos aos Quadros Permanentes (18). A esmagadora maioria (721) são oficiais superiores, tendo ainda colaborado 59 oficiais generais, tal como estão em clara maioria (94,5%) os homens.