Esta é uma guerra feita por cobardes. O exército russo bem podia considerar a frase de Dostoiévski:“Decididamente não compreendo por que é mais glorioso bombardear de projéteis uma cidade do que assassinar alguém a machadadas.” Com efeito, Putin tem-se limitado a atacar de longe as populações civis com mísseis e artilharia pesada, bombardeando de forma indiscriminada dezenas de hospitais, creches e maternidades, mas também teatros, estações de comboios e sobretudo prédios de habitação. Nada disto pode ser considerado objetivo militar. Apenas atos criminosos.
Parece que os comandantes russos entenderam finalmente aquilo que Voltaire defendia: “O desespero ganha muitas vezes batalhas.” Os sete generais russos mortos atestam a ideia. Traduzindo, o desespero dos ucranianos, que lutam pelo seu chão, é que os tem conduzido à resistência e a repelir com sucesso as tropas e os tanques do agressor.
A Rússia tem que perder esta guerra por completo. Não é admissível que na Europa do século XXI um país invada outro e o destrua, que pratique crimes de guerra por demais evidentes, que proceda a execuções sumárias a civis desarmados, os torture e abata a tiro por pura maldade, desde crianças a velhos e fique impune, ao atropelo do direito internacional.
Não é aceitável que se violem mulheres, que se façam decapitações a indivíduos com as mãos previamente atadas atrás das costas, que se executem prisioneiros, que passem com os tanques propositadamente por cima dos corpos dos civis, e que depois os militares russos andem a vender os bens roubados aos que acabaram de assassinar, deixando atrás de si valas comuns com mais de duzentos mortos. A Rússia revelou nesta campanha militar que é fraca de acordo com a doutrina de Otto von Bismarck: “Quanto mais fortes somos, menos provável é a guerra.”
Biden tem razão em chamar carniceiro a Putin – apesar de ser diplomaticamente inadequado – tendo em conta o massacre perpetrado a civis em Bucha, Irpin e noutros locais. Ele terá que ser derrubado do poder pelos seus se a Rússia quiser salvar a face.
Nesta altura só a censura e a repressão sustêm a revolta das mães russas que vêm os seus filhos serem carne para canhão numa guerra inglória. Já Herótodo dizia que “em época de paz, os filhos enterram os pais, enquanto em época de guerra são os pais que enterram os filhos.” Informações diversas dão conta de carros crematórios integrados na coluna militar que avançava para Kyev e que procuravam esconder crimes de guerra mas também evitar que os corpos dos jovens soldados russos voltassem a casa e provocassem a revolta das mães, às quais Zelensky tem apelado repetidamente.
Mais. O autocrata russo, outros dirigentes e chefias militares terão de comparecer no Tribunal Penal Internacional para serem julgados pelos crimes de guerra cometidos enquanto invasores dum país soberano e internacionalmente reconhecido. É o que pensa Carla Del Ponte, antiga procuradora internacional que se tornou conhecida após lidar com casos como o genocídio no Ruanda, que já pediu à instituição um mandado de prisão para o Presidente russo, Vladimir Putin: “Putin é um criminoso de guerra“, declarou ao diário suíço Le Temps. Não me admiraria se os ucranianos se sentissem tentados a retribuir na mesma moeda e a alimentar uma máquina de ódio e destruição.
A Europa tem uma responsabilidade muito grande para com o mundo visto que já sofreu guerras devastadoras e soube construir um projeto de paz duradoura. Tem que se empenhar numa sensibilização clara para que a humanidade acabe com a guerra “antes que a guerra acabe com a humanidade”, como dizia John Kennedy.
Setenta e sete anos depois, Putin e o seu governo estão a imitar na Ucrânia o pior de Hitler e do nazismo. E a sua desajeitada negação das evidências dos crimes praticados não resiste a uma breve análise de qualquer pessoa de boa-fé. A besta negra da guerra regressou à Europa pela mão do antigo oficial da sinistra KGB. Há coisas que nunca mudam.
Houve tempos em que os russos falsificavam o nosso vinho do Porto. Agora sabe-se que falsificam também o seu próprio vodka. É que os militares russos só podem estar a alucinar devido ao vodka marado que o regime putiniano lhes impingiu. Até porque a consciência “é a parte da psique que se dissolve em álcool” (H. D. Lasswell).
“A maneira mais rápida de acabar com uma guerra é perdê-la.”
George Orwell
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