Durante o dia de ontem, quarta-feira, duas audiências parlamentares prenderam a atenção nacional. E em ambas, quem esperava muitas respostas, ficou desiludido.
“Christine Ourmières-Widener, CEO da TAP, trouxe poucas novidades. Explicou as razões da saída de Alexandra Reis, disse que estava em contacto com as Infraestruturas, que autorizaram a saída por escrito, e que presumiu que a tutela estaria em contacto com as Finanças – como seria de esperar num país normal. Mas como somos um país dado a anomalias, os membros do executivo não falam entre si nem se informam”, enquadra Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, no programa Olho Vivo desta semana.
Para Filipe Luís, a audição à CEO da TAP não foi suficientemente esclarecedora. “Sobretudo, a definição, com clareza, dos termos em que Alexandra Reis saiu da TAP: pelo se próprio pé, por acordo ou empurrada… Há duas versões, a do comunicado na altura da saída e outra a do esclarecimento enviado recentemente à CMVM, em que se diz que a TAP lhe pediu para sair. Bastaria Christine Ourmières-Widener ter confirmado esta versão e não se percebe por que não foi explícita.”
“A grande dúvida se Alexandra Reis se demitiu ou se foi demitida é uma falsa questão”, discorda Mafalda Anjos. “Aconteceu na TAP o que acontece todos os dias nas empresas em Portugal – abre-se um processo negocial para tentar um acordo de saída. Não há uma demissão unilateral, há uma negociação. E nesse caso a figura jurídica pode ser a renúncia, ainda que exista um acordo prévio que envolve uma indemnização. O que não invalida que a informação prestada à CMVM tenha sido insuficiente porque não foi referido esse facto.” Para a diretora da VISÃO, “é pura demagogia fazer da CEO o bode expiatório para sucessivos erros políticos e para falta de coragem política para assumir os problemas que vêm com o ativo tóxico que é a TAP”. Sobretudo porque Christine “vai apresentar bons resultado, e tudo indica que consiga lucros e antecipe o plano de reestruturação em três anos.”
“Não ache que não saibamos o que se passou. Havia uma discordância entre Alexandra Reis e a CEO da TAP e encontrou-se uma forma de sair. O ministério das Infraestruturas avaliou mal a dimensão e o impacto da indemnização e o Ministério das Finanças decidiu ir buscá-la negligenciando esse histórico”, refere o jornalista Nuno Aguiar. “Não quer dizer que achemos normal. Já caiu um ministro e secretários de Estado. Fernando Medina, diga o que disser, carregará todo o seu mandato o erro que cometeu. Veremos agora se a investigação da IGF encontra mais ilegalidades. Se assim for, pode haver motivos para demitir a administração da TAP e o governo terá de equilibrar isso com o desejo de vender rápido a empresa.”
Já a ministra da Agricultura, também ouvida no Parlamento, mantém-se na sua: não foi informada de que a secretária de estado Carla Alves estivesse envolvida em qualquer processo judicial. “E, de facto, não estava: não é arguida nem, muito menos, acusada… A ministra continua a dizer que soube pelas notícias do arresto das contas, mas afirma que Carla Alves lhe disse que tudo tinha sido declarado – argumento a que António Costa se agarrou naquele célebre debate parlamentar. Não valeu de nada…”, sublinha Filipe Luís.
Mafalda Anjos destaca que se tenha decidido agora não meter ninguém no cargo, “para evitar precipitações”. “Ou seja, ou afinal o cargo não era necessário, ou é um auto-atestado de incompetência no recrutamento”.
Outro tema em análise foi a greve dos professores. “De um lado, vejo sindicatos corporativistas e conservadores. Do outro, um governo aflito, a tentar aplacar uma classe que sente como parte importante do seu eleitorado. Nem de um lado nem do outro se vislumbra qualquer ímpeto reformista. Discutem-se salários e métodos de colocação de professores, mas não se discute pedagogia, condições nas escolas, disciplina e autoridade ou cursos curriculares”, resume Filipe Luís.
“Há aqui dois cansaços. O dos professores, com salários baixos, pouco atualizados, um modelo de recrutamento que obriga muitos a andarem com a casa às costas e condições cada vez mais degradadas nas escolas. E o cansaço do Governo, fragilizado nesta altura por uma série de casos e remodelações. António Costa quer tudo menos outro foco de tensão, o que pode levar a algumas cedências”, antecipa Nuno Aguiar. “Podemos acabar com algumas migalhas para os professores, abdicando de qualquer reforma estrutural que resolva os problemas estruturais da educação pública.”
“Esta greve é também um sintoma das dificuldades do sindicalismo tradicional, com a emergência de um novo movimento bem mais agressivo e menos dialogante. Os sindicatos têm deixado mal os professores, seja sendo intransigentes com reformas ou abandonando a rua nos anos da geringonça, permitindo que esta tensão se acumulasse”, sublinha Nuno Aguiar. “Mas não deixa de ser interessante que Mário Nogueira e a Fenprof sejam agora vistos como um interlocutor razoável.”
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