Só agora, com a cerca sanitária, é que se destapou a vergonha inadmissível em que vivem, e são explorados, centenas de imigrantes de vários países. As imagens são chocantes. Há quantos anos existe esta situação? Como é possível aceitar que centenas de pessoas vivam sem as mínimas condições sanitárias, atiradas às dezenas para pequenos espaços onde dormem, e passam as horas em que não estão a trabalhar, num ambiente sem nenhuma dignidade humana, e a serem duplamente explorados: no trabalho, e nas condições de vida. O que é isto? Voltámos uns séculos para trás?
As autoridades municipais alguma vez tomaram medidas para impedir essa situação? As autoridades sanitárias locais fizeram algum alerta (muito antes do Covid) sobre as condições de vida dessas pessoas, e as naturais consequências para a Saúde pessoal e pública? As autoridades policiais nunca foram chamadas a verificar essas ilegalidades? As autoridades nacionais não sabiam de nada até fecharem algumas freguesias de Odemira? Não há habitantes em Odemira? Não há delegado de saúde? Não há PSP e GNR? E, já agora, será que este tipo de exploração humana, sem dó nem piedade, existe noutros locais do país? Isto é uma vergonha nacional. Um crime muito bem escondido, silenciado, e sem responsáveis. Como é que passou pela cabeça de alguém, ou de todos, que a Covid não teria um campo fértil nesta degradação humana?
Tirando as polémicas com o Zmar, e as decisões do ministro da Administração Interna, que servem para desfocar do essencial, o que importa, verdadeiramente, é perceber quem são os autores deste tratamento medieval, em que condições é que chegaram estes imigrantes ao nosso país, que redes existem e exploram estas pessoas e, antes de tudo, como é que os empregadores da região aceitaram, ou fecharam os olhos, a toda esta indignidade?
Há uma coisa que não somos: sonsos. Nem podemos deixar que nos façam de parvos. Isto existe há anos, como se percebe, toda a população da região via, sabia e convivia, e até alugava os espaços, e agora há um coro de críticas porque o Governo, analisando a situação, decidiu fechar as freguesias, e enviar equipas de emergência para resolver a situação. E ainda há quem se sinta indignado pela decisão governamental. Bem ou mal, o que o MAI e as autoridades sanitárias estão a fazer, a correr, é dar as condições básicas de vida e de saúde a estas centenas de trabalhadores, que vieram para o nosso país em busca de uma vida digna, e de um salário decente, para conseguirem viver e ajudar os familiares que ficaram. Quantas vezes não nos revoltámos, como País e portugueses, contra as condições infra-humanas em que cidadãos nossos eram explorados e brutalizados em Espanha? O que se passa em Odemira não é a mesma coisa?