Custa-nos sempre muito adotar o que outros estão a fazer, mesmo que muito bem. Gostamos de inventar, de remediar, e de deixar andar. É o nosso fado nacional. A Grã-Bretanha apresentou um plano minucioso para o desconfinamento, com datas e medidas para cada fase, sendo que começa agora em Março, e abre na totalidade em Junho. São quatro meses que vão de um confinamento duro e rígido, que parou completamente o país, até à abertura sem nenhuma restrição. É um plano a sério. Todos ficam a saber o que podem fazer, quando, e em que circunstâncias. E em cada fase são avaliados os dados, com tempo suficiente, para perceberem se sobem, ou descem, mais um degrau.
Podemos copiar? Fazer o mesmo? Seguir este manual? Não, infelizmente. A Grã-Bretanha tem uma vantagem impossível de alcançar, por qualquer outro país europeu. O ritmo acelerado da sua vacinação mostra que, ao dia de hoje, 27 em cada 100 pessoas já estão vacinadas, pelo menos com uma dose (World Data). E com este andamento, e sem falta de vacinas, é previsível que os britânicos atinjam a imunidade de grupo em Maio, sendo que o passo final da abertura só é dado, como se percebe, em Junho. O calendário não foi escolhido ao acaso, como nós vamos ter de fazer.
Por cada cem portugueses, só 6,7 já levaram pelo menos uma dose da vacina, sendo que os completamente vacinados ainda não chegam sequer a metade desse número. Não está nas nossas mãos, e já verificámos que umas vezes recebemos as doses que estavam previstas, pelo mecanismo conjunto, e outras só metade, ou menos. Se este ritmo se mantivesse, 6,7 vacinados por cem pessoas, em dois meses, só lá para início de 2022 é que estaríamos nos 70 por cento. Por isso é preciso ter muita fé, e esperança, para chegarmos lá em Agosto. Percebe-se o desejo de se dar um horizonte temporal aos portugueses, para alívio geral, mas até termos 7 milhões de pessoas vacinadas vai ser necessário muita pressão europeia. O que não é nada fácil.
A isto acresce um pormenor fundamental, que baralha de imediato as nossas expetativas: para Portugal chegar à imunidade de grupo, 70 por cento, o mesmo tem de acontecer com todos os outros países da União, como é suposto e previsto no mecanismo conjunto. Ou seja, não estamos só a falar de 14 milhões de vacinas para nós, mas de 600 milhões de vacinas para 300 milhões de habitantes da União. É muito, muito difícil. O nosso ritmo está dependente de todos o Estados da União, e não há milagres. Quem andou mais depressa na aprovação, e quem comprou em mercado aberto, tem à sua disposição o que precisa. É o caso de Israel, da Grã-Bretanha e dos EUA, os três que lideram o «ranking» de vacinação.
Assim sendo, e tendo em conta que não poderemos estar fechados até à imunidade, todos os planos de desconfinamento serão de grande risco, com elevada probabilidade de falharem. Falta-nos a peça essencial. Lá vamos nós, outra vez, brincar com o vírus.