Imagine que tem vinte e quatro horas para deixar para trás toda a sua vida e fazer-se à estrada sem destino perfeitamente definido.
Vá, ponhamos as coisas mais fáceis: alarguemos o espaço temporal para 48 horas.
Que objetos levaria consigo? Valores claro, telemóvel e computador no caso de os ter, mantimentos certamente, alguns medicamentos recolhidos à pressa na farmácia lá de casa, roupa, calçado, possivelmente algum livro, uma foto, aquele objeto que lhe traria recordações…
Imagine-se a fechar a porta da sua casa ou do que resta dela e pôr-se a caminho rumo ao desconhecido.
Se tiver família, tente pensar em como transportar filhos de colo, ou como reunir outros maiores, pais idosos, dependentes com necessidades especiais…
Decidir se deve ou não levar consigo o animal de estimação ou abandoná-lo à sua sorte, porque o tempo é escasso e os braços são apenas dois.
Talvez tenha a sorte de possuir um meio de transporte- supremo luxo. Ou, quem sabe? Possua um animal de tração que o ajude.
Mas o tempo escasseia e o perigo ronda.
As estradas começam a ser armadilhas das quais só se sai deixando mais pertences para trás.
Imagine-se a perder-se de um dos seus familiares no meio do caos total.
É isto que muitos milhões de homens e mulheres experimentam todos os dias desde há vários anos.
Mas este exercício de imaginação poderá converter-se numa realidade que nos bata à porta em poucos anos.
Os especialistas afirmam que, a manterem-se as condições em que vivemos ao dia de hoje, 1 em cada 5 pessoas no planeta será confrontada com uma mobilidade forçada na próxima década num cenário mais otimista, ou em pouco mais de cinco anos num cenário pior.
O que equivale a dizer que dentro de poucos anos a grande maioria de nós será, duma forma ou de outra, migrante ou refugiado.
A Europa com os seus muros e os seus nacionalismos inflamados, não ficará imune.
A guerra vai entrar numa fase que envolverá a NATO o que significa um maior envolvimento europeu no conflito, desta feita com boots on the ground, como gostam de dizer os nossos estrategas e que traduzido é qualquer coisa como “com as mãos na massa”. Neste caso sanguinolenta.
Uma escalada deste tipo pode levar a que alguns países se vejam obrigados a recorrer a reservistas ou à mobilização forçada.
Muito provavelmente, as centrais nucleares (não os mísseis, mas as centrais ) instaladas um pouco por toda a Europa, irão ser utilizadas como armas, através de ataques terroristas, caso não se tomem medidas para as proteger criando perímetros de segurança assegurados por tropas de manutenção da paz.
Por outro lado de forma muito menos previsível e controlável as alterações climáticas começam a revelar-se na escassez de água quer para consumo, quer para a agricultura, quer ainda para produção de energia. Resultado: uma vaga de fome e de doenças associadas à má nutrição e à insegurança alimentar, dará origem um novo fluxo migratório, com países europeus sem recursos hídricos vendo a sua população buscando alternativas no exterior.
Finalmente a contestação começará a sair à rua. A opinião pública seguirá a opinião publicada e disseminada. Terreno mais que fértil para o crescimento os radicalismos e das intolerâncias.
O povo seguirá os que lhe acenem com soluções, por mais radicais e inexequíveis que sejam, mas que lhes deem duas coisas: bodes expiatórios e o vislumbre de futuro.
Aos que que pensam, agem e são diferentes, restar-lhes-á a fuga e o exílio
Ou seja neste momento enfrentamos os quatro cavaleiros do apocalipse.
Portugal pouco pode fazer em relação aos dois primeiros cenários, mas pode e deve antecipar o terceiro, fazendo uma política de verdade, explicando sem temor as medidas que tem que tomar e a razão pelas quais o tem que fazer, por mais impopulares que sejam.
Os eleitores não são ignorantes nem desinformados. Percebem quando lhes dizem que a situação é dura e por isso a solução não pode ser populista. Mas não admitem falsidades nem discursos redondos e estão cada vez mais cansados do politicamente correto, do esgrimir patético de casos e casinhos, alguns com gravidade, outros meros faits divers que deviam ter sido antecipados e evitados.
Cansados do eterno “empurrar com a barriga” até à próxima e que “o último apague a luz”.
Só que desta vez a luz pode ofuscar de tal maneira que nos cegue a todos. E depois o que tiver um olho, mesmo que vesgo, afirmar-se-á como rei.
As 48 horas estão a esfumar-se.
Desta vez receio que não seja “só fumaça” e o povo está tudo menos sereno.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.