1. A posição do PCP face à invasão da Ucrânia pela Rússia, numa violenta agressão armada em flagrante violação do Direito Internacional, é incompreensível e lastimável. Inclusive, desde logo – ou ainda mais… – à luz do que o PCP sempre afirmou e afirma defender como valor maior: a Paz.
Como é então possível, em nome da defesa da Paz, não condenar frontal, vigorosa e inequivocamente quem faz a guerra, do modo mais flagrante e brutal, invadindo um país estrangeiro? Como é então possível considerar que o apoio ao país invadido, inclusive em armamento para se defender, não é legítimo? E mais do que legítimo, imposto pela necessidade de contribuir para preservar valores fundamentais como liberdade e independência nacional, solidariedade e respeito pelos direitos humanos?
Quem ler na íntegra as posições do PCP sobre a questão da Ucrânia, com a síntese da evolução histórica recente, encontrará bom fundamento em parte do que é dito. E todos estaremos de acordo com que, cito de um seu comunicado, “a Assembleia da República não deve (…) contribuir para a escalada da guerra, a confrontação ou corrida aos armamentos mas sim o oposto, o papel da AR deve ser em defesa da Paz”.
Muito bem. Mas em que é que o acima citado justifica a oposição do PCP à intervenção de Volodymyr Zelensky na AR, e depois, como consequência natural, a sua ausência da sessão em que ele interveio? Em que é que a fala do Presidente ucraniano poderia contribuir para a “escalada da guerra”? E porque, idealmente, não poderia antes contribuir para a Paz, ao condenar quem está a fazer a guerra e apoiar quem é vítima dela, um povo que está a sofrer uma terrível provação?
A Paz, de imediato, só pode atingir-se cessando os russos, por sua iniciativa, a invasão e a agressão armada em curso. E, a prazo, vendo-se obrigados a suspendê-la, ou a negociar (numa posição que não seja de notória supremacia), por força da resistência, mesmo das vitórias militares, do país invadido. Ora, para isto é essencial toda a espécie de ajuda à Ucrânia. Incluindo a de dar voz ao seu Presidente, hoje símbolo do seu povo e da sua heroica resistência ao invasor, que está a devastar o país e a cometer gravíssimos crimes, inclusive abjetos “crimes de guerra”.
Da parte de alguns que combatem do lado ucraniano também não haverá crimes? A Ucrânia é, ou sê-lo-á finda a guerra, uma democracia exemplar? Não houve muitos erros, do lado “ocidental”, que contribuíram para a situação a que se chegou? Não houve e há muitos outros casos que a comunidade internacional não condenou como devia? São questões pertinentes, mas não as que estão na ordem do dia – e é inadmissível servirem de pretexto para não se dizer o que deve ser dito, e fazer o que deve ser feito, em relação à Ucrânia.
Regressando ao PCP, lembro as muitas vezes em que o partido invocou, bem ou mal, o que “objetivamente” significavam e serviam certas posições, em dado momento histórico… E não compreendo como se pode considerar um “insulto ao 25 de Abril” a referência que Zelensky lhe fez. Além disso, penso que o não à guerra e o sim à Paz obriga a sem nenhuma ambiguidade condenar a Rússia, ser solidário e apoiar a Ucrânia.
2. Nas “comemorações populares” do 25 de Abril, a tradicional descida da Avenida da Liberdade teve a participação de muitos milhares, talvez dezenas de milhares, de pessoas. Desde os tempos da Troika que não se via tanta gente a desfilar e ao longo do percurso. Ao grande número e variedade de organizações representadas, juntou-se imensa gente sozinha, com a família e/ou amigos, num misto de afirmação cívica e festa. Muitos levando, em simples cartões escritos à mão, mensagens diversas, contrastando com velhas palavras de ordem, como “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”. Por exemplo, um daqueles cartões dizia só: “E livres habitamos a substância do tempo”, verso de um famoso poema de Sophia.
Pois foi. Resolvi percorrer os vários “telejornais” para ver se davam ideia da dimensão do desfile, do número e da diversidade dos participantes, dos temas em destaque. E nada. Nada de nada. Quase “casos de estudo”. Vá lá que, ao menos, nessa noite do 25 Abril, para acabar em beleza, a CNN entrevistou André Ventura…
À MARGEM
E no Parlamento…
Com o fim das limitações impostas pela pandemia, também a sessão do Parlamento alusiva à libertadora revolução de 1974 voltou a ter mais gente, animação e colorido. Colorido também dos cravos – embora alguns que já o usaram desta vez não o tivessem feito. Caso, se não erro, de Rui Rio, que perdeu a oportunidade de ouro de, a anteceder a leitura da sua intervenção, dizer uma certeira frase de improviso sobre o (para usar uma palavra de que Ventura gosta muito) acabado de produzir vergonhoso panfleto do chefe do Chega contra a data que se comemorava, citando inclusive uma frase de Sá Carneiro que só pode ser usada contra ele. Nota para a oportuna evocação/valorização dos portugueses da diáspora feita por A. Santos Silva.