Estamos todos mais do que fartos de ouvir falar em coronavírus, o que, aliás, é compreensível. Mas a pergunta anda no ar: a pandemia já acabou? A resposta é sim, se tivermos em conta dados como os 85% da taxa de vacinação, a estabilização do Serviço Nacional de Saúde na assistência aos doentes com Covid-19 e o caminho que percorremos, coletivamente, no sentido de nos protegermos – a nós, aos outros e, sobretudo, aos mais vulneráveis. A resposta é não, se ponderarmos elementos como a falta de informação relativa à duração da proteção vacinal e a situação de outros países aos quais, naturalmente, estamos ligados. Se pensarmos em todos os efeitos sociais e económicos da pandemia – nas outras doenças, na educação, na desigualdade, no mercado de trabalho, no ambiente… –, então, facilmente somos levados a concluir que ela perdurará para o resto das nossas vidas.
Precisamos tanto de pessimismo como de respostas absolutas confinadas a um “sim” ou a um “não”. Dispensam-se ainda as visões dos que aguardavam a epifania de um mundo novo no pós-pandemia. Temos necessidade, isso, sim, de cidadãos e de elites políticas sérias e inclusivas, comprometidas com um futuro sustentável, apoiadas no melhor conhecimento disponível na tomada de decisões, conhecedoras da realidade em que vivemos para delinearem políticas públicas ajustadas. Segundo uma análise da Pordata, com base em dados de 2020 do Instituto Nacional de Estatística, 1,6 milhões de portugueses vivem abaixo do limiar de pobreza (com menos de 540 euros por mês). Também não é de agora que se sabe que figuramos entre os países europeus com maior risco de pobreza entre os trabalhadores, ou seja: em Portugal, ter um emprego não é sinónimo de não se ser pobre. Com mais ou menos “bazuca”, a pobreza é a questão em que, de agora em diante, nos devíamos concentrar, pois é dela que decorrem todas as outras. Ainda no último fim de semana, Marcelo de Rebelo de Sousa identificou-a como “o problema dos problemas”: “Antes da pandemia, dizia-se que havia dois milhões de pobres em Portugal; depois da pandemia, dois milhões e 200 mil.”