Em 1976 o Alentejo elegia 16 deputados.
A Assembleia da República tinha 263 deputados e havia 24 círculos eleitorais.
Em 2019 a configuração na Assembleia da República, é distribuída por 22 círculos eleitorais, tem 230 deputados que se distribuem do seguinte modo:
Lisboa, 47 deputados; Porto 39; Braga 19; Setúbal 18; Aveiro 16; Leiria 10; Santarém, Coimbra, Viseu e Faro 9 cada círculo; Viana do Castelo e Madeira 6 cada; Vila Real e Açores 5 cada; Guarda e Castelo Branco 4 cada; Bragança, Évora e Beja 3 cada; Portalegre, Europa e Fora da Europa 2 cada.
O Alentejo (Évora, Beja e Portalegre) elege 8 deputados.
A população do Alentejo (região) representa 4,5% dos habitantes de Portugal.
Repito, o Alentejo tem 8 deputados, uma população residente de 467 422, ocupa quase 1/3 do território nacional e representa 4,5% da população de Portugal.
Os eleitos representam 3,5% do total de deputados.
Estamos em meio de um processo de recenseamento.
Em setembro/outubro de 2023 haverá novas eleições legislativas, presumo que com base nos novos censos.
E esperamos o quê?
Para conhecer bem a dimensão do problema é necessário também não esquecer que o Alentejo tem um menor número de jovens do que a média em Portugal, e tem maior número de idosos do que a média em Portugal. A manter-se a diminuição geral de população em Portugal o impacto será, expectavelmente, mais gravoso no Alentejo.
Quando um sistema permite que 1/3 do país seja representado por 8 deputados, com tendência a diminuir, mesmo representando apenas 4,5% da população, provavelmente será de o repensar.
E porquê esta realidade?
Porque no sistema eleitoral Português se aplica o método de Hondt uma fórmula de cálculo, utilizada na distribuição de mandatos pelos candidatos das listas concorrentes a eleições, com base no princípio da representação proporcional. Consiste na repartição dos mandatos pelos partidos, proporcionalmente à importância da respetiva votação.
O método de Hondt, declaradamente, favorece os partidos maiores.
Mas, pior do que isso, favorece a abstenção, quando se sabe que a expressão do voto não terá consequências diretas (porque só 3 ou 2 serão eleitos) pode haver uma tendência a não votar.
Numa região como o Alentejo grande parte dos votos são desperdiçados, sendo o voto a essência da democracia isto é incompreensível.
Em Portalegre, que apenas elege 2 deputados, 53,28% (26 127 votos) dos votos foram “não aproveitados” em Évora foram 40,6% (28 948 votos) e em Beja 33,96 % (20 988 votos).
Em Évora o último deputado foi eleito com 13 980 votos.
A taxa de abstenção no Alentejo foi de 47% o que em termos gerais se traduz do seguinte modo: havia 414 749 eleitores votaram 220 504 e abstiveram-se 191 245. Dos 220 504 que votaram o sistema desprezou 76 063 votos. Será razoável?
64% dos eleitores não tiveram qualquer expressão para o resultado final, ou porque não votaram ou porque os seus votos já não influenciaram em nada o resultado.
Em resumo:
1/3 do país quase não tem voz
1/3 do país não tem transportes
1/3 do país não tem suficientes empregos para os jovens que qualifica
1/3 do país não possui um hospital moderno e adequado
1/3 do país tem falta de água
1/3 do país está cada vez mais envelhecido
1/3 do país está cada vez mais despovoado
1/3 do país está cada vez mais abandonado
1/3 do país quase não tem serviços públicos
1/3 do país quase não tem voz!
E ninguém se incomoda, não se comenta na Assembleia da República e não ouvi nenhum partido ainda, seriamente, a tocar neste assunto.
Porquê?
Eventualmente porque os grandes partidos são os mais favorecidos no sistema atual e porque é pouco importante que se despreze 1/3 do território nacional.
Não tem impacto nos resultados eleitorais.
E é incompreensível.
O sistema, e modo de eleição, que parecia, em 1976, justo, tornou-se num círculo vicioso, “há falta de muita coisa…há pouca gente…como há pouca gente…(não há impacto em resultados eleitorais) há pouca coisa”.
E é isto que se deve quebrar sob pena de nos tornarmos num país abandonado, injusto social e economicamente e, em consequência, aberto a todos os radicalismos.
É muito fácil prometer mais a quem tem muito pouco.
Há várias maneiras de alterar este modelo, mas para isso é necessário que se queira.
E nem sequer é necessário inventar a roda, podemos, pura e simplesmente, começar por analisar o modelo de eleição para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, totalmente diferente do modelo que seguimos no continente, e no qual 8.8% dos deputados são eleitos pelo chamado “círculo de compensação” (aí sim aplicando o método de Hondt).
Mas principalmente é necessário começar por pôr na agenda de TODOS os partidos: discutir a lei eleitoral.
Se nos calarmos nunca vai acontecer!