Recentemente, uma dirigente de uma associação hoteleira portuguesa explicava na televisão o constante aumento de reservas. Socorrendo-se de números, listou os países de onde provêm os turistas que vão enchendo os hotéis e apartamentos portugueses no Verão.
A lista de países é quase exclusivamente europeia e coincide, em boa parte, com o mapa da emigração portuguesa. Porque fiquei curioso, e porque se tratava de uma emissão de linha aberta, telefonei para a cadeia de televisão para colocar a questão: “sabe qual é a percentagem de portugueses das comunidades na ocupação hoteleira?”.
A resposta, óbvia e inevitável, não se fez esperar: ninguém sabe. E a razão é simples. Um emigrante fará parte das estatísticas de estrangeiros caso se identifique com um passaporte de outro país; será considerado turista interno se apresentar documento de identificação português. Foi inclusivamente explicado que o simples elemento nacionalidade não é suficiente e que o cartão de crédito utilizado para garantir ou pagar uma reserva pode ser o fator que coloca o cliente na lista dos portugueses ou dos estrangeiros.
Esta problemática, aparentemente anódina, tem influências nefastas no cálculo do peso das comunidades residentes no estrangeiro na economia portuguesa porque os emigrantes não “contam”, a não ser através de extrapolações.
Mas esta perceção deficiente não se resume ao ramo da hotelaria. Tendo a possibilidade de conversar com decisores do ramo da alimentação em Portugal já perguntei a alguns se conhecem o mercado fora de portas para o qual exportam. As muitas empresas portuguesas do setor têm estratégias bastante distintas de promoção, mesmo quando se trata do mesmo tipo de produto e da mesma gama de preços.
O exemplo dos sumos e das águas portuguesas é um dos casos mais flagrantes. Nos seus comunicados de imprensa e relatórios anuais as marcas salientam sempre a “crescente exportação para os mercados externos, nomeadamente da União Europeia”, ou afirmam que “as exportações para França aumentaram 30% em dois anos”.
Quando interrogados sobre a clientela dos seus produtos, os responsáveis de exportação, e até alguns CEO das mais conhecidas marcas lusas, insistem que “as clientelas suíça e alemã” apreciam muito aquilo que produzem. Ou afirmam que a campanha publicitária no mercado luxemburguês será feita em língua francesa e nos jornais locais.
Tal como estes decisores eu também não disponho de estatísticas sobre o consumo de Sumol ou Licor Beirão cá fora. Mas sei que é mais fácil encontrá-los nos países europeus onde há forte presença de emigrantes. E tenho a impressão – que vale o que vale – de que as grandes superfícies luxemburguesas, francesas ou suíças não teriam esses produtos à venda se a comunidade portuguesa não existisse.