Mês de dezembro em Nagoya. O frio aumenta gradualmente e as árvores estão quase todas descascadas. As noites são mais luminosas, as pessoas mais agitadas, o comércio mostra o que tem de melhor e todos os caminhos são vermelhos, verdes e dourados. Até aqui nada de novo. É o mês do Natal e é incontornável falar sobre isso.
“Irasshaimaseeeeee…” ecoa nas grandes superfícies comerciais e nas ruas. Todos os funcionários das lojas colocam a voz em tom estridente e cantam a última sílaba com prolongamento. É a palavra mais ouvida quando vamos às compras e significa “bem-vindo”. E sabem qual é a música mais ouvida? Essa mesmo. Natal só é Natal se ouvirmos a Mariah Carey 10 vezes por dia com “All I want for Christmas is you”.
A quantidade e qualidade da oferta são de ficar com os olhos em bico. Este é o país certo para quem gosta de oferecer presentes com detalhe. Há inúmeros papéis, sacos, etiquetas, fitas e lacinhos e os funcionários têm uma perícia invejável a fazer embrulhos. Muitos aplicam a técnica do origami e usam uma folha que vão dobrando até fechar com uma só etiqueta para depois nos entregarem como se fosse o objecto mais valioso do mundo. Dá gosto!
Há filas de gente por todo o lado mas é uma confusão ordenada. O sangue na guelra português fervilha quando temos muitos obstáculos que nos impeçam de ir ao ritmo que precisamos. Cá aprendemos a saber esperar, a não mandar vir e a seguir os carreiros de pessoas.
É também altura dos japoneses enviarem postais de felicitações para 2017, o ano do galo. De 31 de dezembro a 4 de janeiro o país irá parar para celebrar o novo ano.
No Japão, a celebração do Natal está a crescer. Embora tenha um simbolismo diferente do ocidente por questões religiosas, pois a maioria dos japoneses são xintoístas ou budistas, há uma crescente paixão pela magia da época e pelo “Santa Kuroosu” (Santa Claus).
Enquanto para nós é a festa da família, para os japoneses é a festa dos namorados. Nestes dias os “love hotels” (motéis com nomes requintados) têm lotação esgotada, os restaurantes reservam mesas para dois e as marcas de jóias e carteiras esgotam os seus stocks. O amor está no ar com muitos olhares e sorrisos cúmplices mas poucas demonstrações de carinho em público. Os namoros aqui são assim, contidos.
As crianças já começam a perceber que no Natal se celebra o nascimento do menino Jesus mas é uma realidade distante. Na manhã do dia 25 abrem os presentes que o Santa san lhes deixou debaixo da árvore e nos dias que antecedem recebem muitas guloseimas.
No dia 24 é tradição jantarem frango frito, que encomendam com meses de antecedência para evitar as filas de espera, e um bolo de chantilly com morangos. À noite é possível assistir ao fogo de artifício no porto de Nagoya.
É o segundo ano consecutivo que celebro o Natal a oriente, com o meu marido e a minha filha, longe da restante família. Para quem, como eu, tem especial apreço por esta quadra, estar a mais de 10 000 quilómetros de distância dos que nos são queridos é no mínimo desafiante.
Passei a valorizar ainda mais as cartas e as encomendas, tanto as que nos chegam como as que enviamos, por isso adoptámos o costume japonês e damos uso ao papel e caneta surpreendendo os que, apesar da lonjura, estão sempre ao nosso lado.
No outro dia fomos à feira de Natal no centro da cidade, onde havia barraquinhas de comes e bebes, artesanato e um palco onde estava um coro de crianças a cantar as músicas que conhecemos em versão japonesa. Estava um frio de rachar e eles tinham o essencial para a sua actuação. Sem adornos ou grande coordenação, tinham o sorriso nos lábios, a voz doce e a ingenuidade suficientes para me deixarem emocionada. E pensei “afinal aqui também é Natal!”.
Sem feriado, missa ou lareira e sem o mítico anúncio do azeite Gallo, mas com uma mesa bem portuguesa, manteremos a nossa tradição. Não nos vai faltar o bacalhau nem o perú, o bolo-rei, as filhós de abóbora e o arroz-doce, nem o pãozinho caseiro ou as broas de mel e castelar. Também não nos faltarão os sonhos, aqueles que nos alimentam todos os dias do ano e que sob o espírito natalício nos fazem crescer e crer que conseguimos unificar o mundo num só abraço.
Acredito que as diferenças culturais e religiosas se esbatem quando se sente verdadeiramente o que esta quadra representa. Se estamos em paz, com conforto e segurança, e se no nosso coração prevalece o altruísmo então, seja qual for o nosso destino, estamos preparados.
Feliz Natal e até para o ano!
メリークリスマス アンド ハッピーニューイヤー!!!
(Merii kurisumasu ando happiinyuuiyaa)
ヾ(^∇^)☆ミ
VISTO DE FORA
Dias sem ir a Portugal… 107
Nas notícias por aqui… Kazuhiko Kosaka, um comediante japonês veterano que nunca foi famoso, tornou-se uma celebridade depois do sucesso viral de “Pen Pineapple Apple Pen”. A música, a tocar desde setembro deste ano, continua a bater recordes e a invadir as casas dos japoneses.
Sabia que por cá… no inverno, são características as iluminações nocturnas dos jardins. Nabana no Sato é umas das principais atracções de Nagoya. O jardim conta com mais de 8.500.000 luzes LED.
Um número surpreendente: são mais de 50 000 as lojas de conveniência espalhadas pelo país. As konbinis estão abertas 24 horas por dia, todos os dias do ano.