O verão de 2020 deverá bater todos os recordes de calor, avisou a Organização Meteorológica Mundial. As populações do Sul da Europa, em particular, devem preparar-se para enfrentar, nos próximos meses, “temperaturas globalmente superiores ao normal”. Com base nas previsões da meteorologia e do histórico de fogos florestais registado nos primeiros meses do ano, a Comissão Europeia também deixou um alerta: vamos entrar numa época de risco alto de incêndios, prevendo-se que a quantidade de casos e de área ardida seja superior à média ocorrida nos últimos dez a doze anos. A agência meteorológica dos EUA prevê que, por causa da temperatura acima da média que se regista atualmente no oceano Atlântico, vão ocorrer, em princípio, muito mais furacões, alguns de grande intensidade, nos próximos meses. E isto também deve ser um aviso para nós, já que, como sabemos, nos últimos anos, alguns ciclones começaram a ter a tendência de se desviar da sua rota habitual e passaram a atingir também Portugal (como o Leslie, em 2018, e o Lorenzo, em 2019).
Os avisos foram feitos e, em particular neste ano de 2020, ninguém os pode considerar demasiado alarmistas e sem justificação científica. Se algo devemos aprender com esta pandemia da Covid-19 é a necessidade de escutarmos os cientistas, acreditarmos nas medições rigorosas, aceitarmos que não controlamos o planeta e que temos de saber, por antecipação, como nos podemos adaptar às mudanças há muito previstas, bem como às ameaças que exigem respostas coordenadas à escala global. Os avisos são sérios e repetidos, nos últimos tempos, por todos os organismos que, de facto, detêm o saber e o conhecimento sobre o aquecimento global. Há uma tendência evidente, alicerçada em registos captados um pouco por todo o mundo: onze dos últimos doze anos foram os mais quentes alguma vez registados. Como sublinhou Carlo Buontempo, diretor do Serviço de Monitorização das Alterações Climáticas do Copernicus, “esta ocorrência não é sinal de uma flutuação estatística, mas sim a prova de que o clima está mesmo a aquecer”. Só na Europa, por exemplo, a temperatura média subiu, na última década, mais 1,3 graus face ao que se registava na década de 1970.
Apesar da evidência repetida do aumento das temperaturas e do crescimento dos fenómenos extremos, os avisos sobre a ameaça climática parecem ser tão escutados como foram os alertas de que o mundo se devia preparar para a pandemia de um novo coronavírus. Este silêncio tem sido acompanhado, nos últimos meses, pelas “boas notícias” de que, afinal, graças às quarentenas e à paragem forçada de milhares de indústrias em todo o mundo, o planeta até começou a registar melhoras. Lançaram-se “aleluias”, porque tinha baixado a poluição atmosférica, gritaram-se “hurras” pela diminuição da emissão de gases com efeito de estufa, abriram-se sorrisos com a notícia de que a vida selvagem começava, em alguns casos, a invadir ambientes citadinos e que até os oceanos pareciam mais limpos, já que o tráfego de navios de cruzeiro, petroleiros e cargueiros ficou quase paralisado. Pois, mas, apesar de todas essas melhorias e da redução da emissão de gases, os últimos dados divulgados pela credível agência americana dos Oceanos e Atmosfera (conhecida pela sigla NOAA) são esclarecedores: o nível de dióxido de carbono na atmosfera nunca foi tão alto como agora. Segundo a agência, nunca, nos últimos três milhões de anos, a concentração dos gases responsáveis pelo efeito de estufa foi tão alta como a que foi medida em maio deste ano. É bom que este aviso não seja esquecido. E que se perceba que, apesar de podermos ter diminuído a atividade industrial, nunca parámos de emitir carbono para a atmosfera. E como o que já lá estava não desapareceu, a soma aumentou.
Os sinais são claros: isto vai continuar a aquecer e os perigos estão à vista. No imediato, por exemplo, além da distância social nas praias, é melhor que comecemos a preocupar-nos, a sério, com as florestas. Ninguém diga que não foi avisado…
(Editorial da VISÃO 1423 de 11 de junho)