Enquanto entidade reguladora, o Banco de Portugal tem alguns problemas. Designadamente, o facto um pouco problemático de não regular nada. Talvez seja uma questão de expectativas. Uma vez que se apresenta como órgão de supervisão, as pessoas esperam que, como os super-heróis, tenha uma super-visão. Quando, na prática, se percebe que tem uma infra-visão, desilude. O Banco de Portugal é uma espécie de Super-Homem que mantém os óculos do Clark Kent – e têm ainda mais dioptrias. Durante anos não vê nada, até que alguém é apanhado num grande escândalo, altura em que o Banco de Portugal aparece e, após madura reflexão, considera que essa pessoa talvez não seja a mais idónea. É um serviço inestimável. Trata-se de uma condecoração ao contrário. Assim como o Presidente da República atribui comendas a gente cujo mérito é evidente (enfim, às vezes), o Banco de Portugal existe para, depois de toda a gente ter percebido que determinada pessoa não se recomenda, apor o seu selo de qualidade a essa percepção generalizada. A todo o momento se espera que o Banco de Portugal emita um comunicado a dizer que um tal Alves dos Reis é capaz de não ser a melhor pessoa para dirigir instituições de crédito, pelo que deve ter a licença suspensa por um período de 15 dias. Se o Banco de Portugal fosse a entidade reguladora dos galinheiros, em 2050, na sequência de alguns acontecimentos suspeitos, criaria um gabinete de crise para reavaliar a idoneidade das raposas.
É por isso que, ao contrário da generalidade das pessoas, tenho uma opinião muito positiva sobre o mundo da alta finança no nosso país. Tendo em conta a capacidade de fiscalização do Banco de Portugal, creio que temos falcatruas a menos. Os agentes económicos sabem que podem fazer quase tudo sem serem apanhados e, ainda assim, aproveitam essa circunstância com alguma moderação. Um país com bandidos a sério já teria sido completamente saqueado – e não apenas quase completamente, como é o caso.
Nesta ocasião específica, o Banco de Portugal está bem acompanhado. Vários comentadores foram tomados por uma surpresa violenta quando leram as notícias sobre as origens da fortuna de Isabel dos Santos. Talvez os jornais e as estações de televisão pudessem, além do salário que lhes pagam, munir cada um deles de um pastor alemão e uma bengala. Era o mínimo.