No dia 26 de junho, ao passar os olhos pelas notícias, deparei-me com a capa de um jornal com a seguinte manchete em letras garrafais “Magistrados e deputados tiveram maiores aumentos salariais na função pública”, parangona que se difundiu durante o dia em todos os meios de comunicação social.
Por momentos ainda pensei que a manchete se referia a uma categoria de magistrados de um qualquer outro país europeu, pois na qualidade de magistrado, quer eu, quer os demais magistrados, vimos o nosso vencimento líquido ser reduzido de forma progressiva ao longo dos anos.
Posso dizer que com mais de 24 anos de serviço, o meu vencimento num índice remuneratório quase de topo da carreira é hoje pouco superior, em termos líquidos, aquele que eu auferia no início da carreira.
Nos últimos dez anos nenhum dos índices remuneratórios da carreira de magistrado sofreu um único cêntimo de aumento.
Pelo contrário, a taxa de contribuições para a ADSE passou de 1,5 % em 2007 e foi sempre subindo até ao valor atual de 3,5 %, sendo que em contrapartida as comparticipações foram sendo reduzidas ao longo dos anos.
Durante o período da troika, entre 2011 e 2014, viram os seus vencimentos cortados em 10% e estiveram igualmente sujeitos aos congelamentos da função pública.
Da mesma forma a taxa média de IRS sofreu, nos últimos doze anos, um agravamento em, pelo menos, sete pontos percentuais, pelo que o rendimento que os magistrados levam hoje para casa em cada um dos escalões remuneratórios é manifestamente inferior aquele que auferiam em 2010.
É, assim, manifestamente falso que os magistrados tenham auferido qualquer aumento desde 2012.
Para além disso e de acordo com o último relatório da Comissão Europeia para a eficiência da justiça, datado de 22 de outubro de 2020 e relativo a dados de 2018, é possível observar que os magistrados portugueses são aqueles que na Europa apresentam um dos salários médios brutos mais baixos em comparação com o salário médio bruto nacional, ficando abaixo de países como a Lituânia, a Eslovênia, a Sérvia ou a Bulgária.
Por outro lado, em virtude da grave falta de magistrados do Ministério Público, são cada vez mais as situações em que os mesmos são chamados a acumular funções, tendo que exercer funções em mais de um tribunal, procuradoria ou secção de departamento da mesma comarca.
Não obstante estar prevista na lei o direito a um acréscimo remuneratório por esse exercício de funções em regime de acumulação e o mesmo ter sido reconhecido pelo Conselho Superior do Ministério Público, o que é certo é que desde 2019 o Governo tem-se sonegado a pagar as referidas acumulações, pelo que nenhum dos magistrados nessas circunstâncias recebeu um único cêntimo por esse serviço acrescido e cuja responsabilidade é decorrente da falta de investimento, por parte dos sucessivos governos, em recursos humanos e materiais para o Ministério Público exercer cabalmente as suas funções.
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