Numa altura em que se anteveem limitações e restrições ao Natal tal como o conhecemos, muitas vozes se levantam, sejam de concordância, sejam de discordância. Uma coisa parece ser certa, este ano, o Natal poderá ser um pouco diferente daquilo a que nos acostumamos. Ninguém parece indiferente àquilo que se avizinha e muitos têm dito com todas as letras que não ficarão sozinhos no Natal. Por outro lado, há quem se indigne e diga que este ano não poderão existir ajuntamentos e que “ninguém morre” por não estar com a família este ano.
Contudo, o distanciamento tem-se feito sentir desde que a pandemia se instalou e, um pensamento tem assolado a minha existência e a minha profissão nos últimos dias. Estaremos nós a legitimar uma espécie de abandono em prol de um gesto aparentemente altruísta de proteção? Para quem não tem a sorte de viver perto da família e de a poder ver a qualquer momento, estas limitações podem ser angustiantes.
Será que o casal de 70 anos, que vive no interior esquecido, entenderá que os seus filhos não vão ter com eles no Natal para os proteger? Não olharão eles para isto como uma espécie de abandono? E quem diz o Natal diz as outras datas mais ou menos importantes. Mais do que eles entenderem, preocupa-me que possamos realmente estar a abandonar os mais velhos, os pais que por amor viram os seus filhos partir, em busca de uma vida melhor e que agora se veem completamente sós, por entre o inverno agreste e a companhia de um cão. Estaremos efetivamente a proteger ou a abandonar?
Para muitos, os fins-de-semana maiores são oportunidades únicas para visitar os seus que não veem com frequência por estarem muitas vezes a mais de 600 km de distância. Para esses mesmos muitos, não é possível contornar as restrições que proíbem os encontros ao fim-de-semana estando durante a semana com os seus. Para muitos não existe margem de manobra ou contorno possível. Existe apenas uma impossibilidade. Talvez alguns não tenham estado com a família no dia 1 de novembro, mas se calhar, já tinham estado a 25 de outubro ou estiveram a 4 de novembro. Mas, para quem vive longe, isso pode tornar-se impossível. Muitos viram os seus filhos apenas uma vez este ano. Muitos idosos não puderam ter consigo os netos durante um ano, sendo esta uma das poucas razões de alegria de quem já pouco espera da vida.
Será que estamos a protege-los de uma pandemia, matando-os de solidão?
É sobre isto que é preciso pensarmos, refletirmos e agirmos. O meio-termo poderá ser a solução para proteger sem abandonar. Foquemo-nos nisso!