A qualidade do transporte público dá uma ideia razoável da qualidade de vida de um país. Poderia acrescentar que a qualidade da oferta alimentar disponível nos transportes públicos e nos locais onde os apanhamos não fica atrás para se fazer esta avaliação. Infelizmente, em Portugal, e por diversas razões, é confrangedora a oferta alimentar nos nossos transportes e locais público relacionados.
Poderíamos começar pelos bares das estações de camionagem, espalhadas pelo país, onde o refrigerante, a cerveja, o bolo, o folhado e o café são hegemónicos. O mesmo se passará em muitas estações de comboios que servem os cidadãos ao longo do país. E nas áreas de serviço nas auto-estradas e também nos bares e restaurantes dos aeroportos onde o problema da oferta saudável pouco acessível se mantém. Só que aqui, o obstáculo é o preço, bastando pedir uma sopa ou um sumo natural para se perceber que o seu custo chega a duplicar face à média. Em outros locais, como as estações de metro, é quase impossível beber água da rede pública. Ou encontrar uma peça de fruta fresca, por exemplo. E dentro das composições ou veículos que fazem serviço público, a oferta de má qualidade nutricional continua. Com a TAP a oferecer frequentemente boiões de fruta açucarada e os bares do Alfa Pendular com oferta variada de refrigerantes, bebidas alcoólicas e salgados e, ao invés, pão de qualidade, sumos naturais, fruta em natureza ou outra qualquer variação menos tóxica para a nossa saúde quase desaparecida.
Existem certamente motivos para tal acontecer. Desde o gosto e a procura dos clientes, passando pelas rendas elevadas dos locais até às questões de segurança alimentar que encheram, desnecessariamente, as nossas mesas de plástico e de alimentos embalados. Tudo razões economicamente válidas para tornar o negócio rentável utilizando produtos excessivamente processados, com excesso de sal e açúcar e com maiores margens de lucro.
Contudo, em muitos destes locais, não existe a possibilidade do consumidor se defender, pois as alternativas não existem. Mesmo assim, estes espaços são públicos ou resultam de contratos de concessão onde o Estado pode impor um conjunto de normas que salvaguardem a saúde dos cidadãos. Nas cláusulas de concessão ou na discussão dos concursos para a oferta alimentar nos transportes públicos existirá esse cuidado? Tenho sérias dúvidas que por regra tal aconteça. Daí resulta uma oferta alimentar de má qualidade ou o oposto do que o mesmo Estado exige para escolas e hospitais, onde felizmente, e nos últimos anos, se fez uma grande reforma e existe hoje um cuidado diferente do que existia há alguns anos.
Mas se este é um caminho a percorrer pelo Estado (que somos todos nós) os cidadãos não se podem colocar à parte desta discussão. Ser exigente e reclamar por escrito e nos locais adequado, fazendo sugestões, deveria ser também o nosso papel. E exigir, a preços razoáveis, pão de qualidade (Portugal tem uma enorme variedade de pão regional de grande qualidade), fruta da época (que pode ser servida fresca, embalada, desidratada…) lacticínios com pouco açúcar (existe hoje uma enorme variedade de iogurte e outros fermentados muito saudáveis), sumos naturais de fruta ou hortícolas, sopas variadas (onde os portugueses são exímios), frutos secos e ou gordos (porque será que os frutos do mediterrâneo como a amêndoa, o figo seco ou a noz nunca aparecem nestes sítios) e até pratos à base de conservas que são uma forma prática e saudável de comer peixe…São tantas as variações quanto é versátil a culinária nacional.
Hoje sabemos que a alimentação inadequada é o principal responsável por retirar anos de vida saudáveis aos portugueses. Neste sentido, a Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (EIPAS) e o Plano Nacional de Saúde, seguindo as orientações da Comissão Europeia e da Organização Mundial da Saúde, sugerem a criação de ambientes promotores da saúde nos locais onde vivemos e trabalhamos, como estratégia principal para a criação de bem-estar nas populações. Os transportes públicos não deveriam ser exceção.