No dia 22, as duas grandes notícias da Comunicação Social foram a verdadeira dimensão do buraco do Banif e a decisão de subir o salário mínimo para 530 euros. E houve quem se interrogasse sobre qual a mais importante ou qual delas ofuscou a outra. Eu dei por mim a pensar nas duas como produto de uma mentalidade obsoleta que nos vai levar alegremente à ruina e à pobreza totais. A mentalidade chama-se: empurrar com a barriga. E tem como origem a ausência de uma visão de futuro (basta atamancar o presente) e como base filosófica a impunidade.
No caso do Banif, penso que há duas questões a considerar.
Em primeiro lugar, fico à espera do apuramento das responsabilidades: do anterior governo, do Banco de Portugal e dos gestores do banco que, porventura, irão ser afastados com magnas indemnizações e sem vergonha pública. Se calhar até virarão comentadores económicos na televisão, como os nossos anteriores ministros da área das finanças.
Em segundo lugar, quase todos foram unânimes em considerar a solução do actual governo como boa. Até o anterior PM achou que sim. O problema, para mim, foi a justificação que deram: é a solução que trará menores custos para os contribuintes. Perante isto, como pode o cidadão comum discordar, sobretudo quando sabe que não faz a mais pálida ideia se tal é verdade ou não? Pois é, mas eu discordo. Porque, mais uma vez, devemos pensar a longo prazo. E perceber que as crises futuras dependem do modo como se enfrentam as crises presentes. Por isso, a minha opinião seria no sentido de ir «pelo princípio», como o título das minhas crónicas, e saber se é justo que seja o contribuinte – inclusivamente o que ganha o salário mínimo, agora benevolamente acrescido – a pagar o buraco. É claro que não é. Se, no caso do BPN, que foi o primeiro, o banco tivesse pura e simplesmente falido, com prejuízo para os que lá tinham dinheiro e investimentos (que poderiam ir pedir contas aos anteriores governantes, aos gestores do banco e a todos os que apadrinharam a coisa – e mais não digo para não ir preso), o que aconteceria? Revolta, políticos e reguladores penhorados, falta de confiança nos bancos e dinheiro no colchão? Exigência de uma reforma total do sistema? Não sei. Poderia ser mau no presente, mas talvez fosse bom para o futuro, pois é absolutamente necessário que o sistema bancário mude de vez neste país. Pelo menos, talvez acabasse a impunidade (ou mais ou menos). E, assim, talvez BES e Banif fossem resolvidos a tempo, e bem, sem os custos que se aproximam. Como já disse aqui várias vezes, precisamos urgentemente de pensar «algo completamente diferente».
A história do salário mínimo anda à volta do mesmo. Qual é o salário mínimo mais justo? 485? 530? 600, como quer a CGTP? Mais uma vez, o cidadão comum não consegue ter opinião, porque a questão parece tornar-se técnica. Mas é possível pensar «fora da caixa» e fugir ao colectivismo mental que nos domina por via de séculos de cultura tribal: um salário mínimo igual para todos é tão pouco lógico como o salário igual para todos do imaginário comunista (menos a malta do partido, claro). Porque as pessoas não são todas iguais. É outra vez a questão da impunidade.
Então, já que estamos em altura de balanço próprio do fim do ano, vou propor um raciocínio completamente diferente. E para que fique claro para todos, não só concordo com o aumento do salário mínimo, como penso que devia ser ainda maior. Porque não acho – e já aqui o escrevi, numa crónica como esta – que sejam os que menos ganham os responsáveis por termos 65% da produtividade média europeia: a responsabilidade é sempre de quem manda. Mas só concordo com a existência de um salário mínimo enquanto não for implementado o meu raciocínio inovador: vamos criar um sistema de avaliação – objectivo, sólido, rigoroso, imparcial e etc. – do desempenho de todos os indivíduos em idade activa e, depois, que cada um receba em função do que contribui para o país. Para certas pessoas, 530 euros será um exagero, pois não fazem nada de produtivo. Para outras, será uma injustiça provocada pela impunidade dos que fingem que trabalham. Portugal tem de resolver o problema da produtividade, mas só o resolverá com meritocracia. Não com a política do salário igual.
Atenção que, e agora para terminar, esta avaliação aplicar-se-ia a todos, mesmo aos que pairam no Olimpo da governação, dos principais órgãos de soberania e da regulação bancária. E, tal como a regra de justiça social que defendo estabeleceria, se as pessoas recebem do país de forma proporcional ao que dão ao país, também deveriam indemnizar o país de forma proporcional ao prejuízo que lhe causaram. Reformas douradas? Se houve prejuízo, deveria haver devolução.
Para todos os que já estão a ranger os dentes e a chamar-me utópico, devo lembrar que utopia significa perfeição. Bom ano de 2016.