Esta semana ficámos a saber que os jovens entre os 15 e os 20 anos, a geração Z, preferem pesquisar no TikTok, em vez do Google; e que o Governo quer passar os manuais escolares para o digital, pasme-se, já a partir do próximo ano. Soubemos também que já existem experiências piloto em várias regiões do país.
Não fiquei surpreso com a escolha da geração Z. As novas gerações já demonstraram que, de facto, uma imagem vale mais do que mil palavras, que desenvolvem períodos de atenção mais curtos do que nunca, que querem dados mais rápidos, mais desafiantes e até imprevisíveis. E, isso é TikTok!
Já quanto ao fim dos manuais escolares tal qual os conhecemos… parece-me que a “Ficha Técnica” do Portugal real ainda não chegou ao Ministério da Educação. Ou, se chegou, ninguém na Avenida Infante Santo, leu as letras pequeninas que revelam um país feito a várias velocidades, onde há povoações onde a rede de telemóvel é uma miragem, quanto mais a Internet. De igual modo, não leram o ponto que refere que há agregados familiares que não podem pagar a uma operadora para receber na casa de família Internet e canais para além dos oferecidos pela TDT. Também não leram aquele parágrafo que diz que em muitas escolas são os professores quem leva, a expensas suas, os materiais escolares para trabalhar na sala de aula.
Mas como quem nos governa pensa em grande, fomos também informados pela VISÃO de que serão comprados 600 mil computadores de uso individual para alunos e professores. Isto lembra-me o “Magalhães” de Sócrates e o fracasso pelo qual se saldou.
Sou fã do digital. Defendo que é ali que reside o futuro – veja-se a evolução do e-Commerce e como, por exemplo, o retalho tem respondido ao desafio –, mas porque insiste quem nos governa em “nadar na maionese”? Não deveríamos primeiro resolver problemas estruturais como democratizar o acesso à Internet e só depois anunciar e concretizar a troca do manual escolar em papel pelo digital?
Ainda este verão passei uns dias na Beira Baixa, numa aldeia onde as poucas crianças brincam na rua, mas onde o meu telemóvel estava mudo por imposição da inexistente infraestrutura móvel. E esta situação repete-se por muitas povoações deste país. Curiosamente em Marrocos, país que muitos consideram de 3.ª mundo, há rede nas montanhas do Atlas e em pleno deserto já ninguém se guia pelas estrelas.
Gostava de terminar esta semana com algo positivo, mas tenho dificuldade até porque, como escreveu um jornalista que muito admiro, “acabou a época do “porra, não limpámos as florestas!” e começou a época do “m**** [como escreveu na rede social não teve qualquer cerimónia em preencher os *!], não limpámos as sarjetas!”.
E neste vai e vem constante andamos sempre atrás do prejuízo, em vez da prevenção.
Num país a braços com uma seca, bastaram uns pingos de chuva para que os prejuízos ascendessem a largos milhares de euros. Inundações, destruição de campos agrícolas, derrube de muros e ruas destruídas foram uma constante de norte a sul, com muitos dos responsáveis a justificar que “não há memória de uma chuva tão intensa e prolongada.” Olhando para os seus rostos percebo que são pessoas mais velhos do que eu. Ora se na minha memória tenho outonos com chuva intensa, qual é a parte que eles não viveram? Talvez a da incúria e da falta de limpeza da rede de drenagem de águas pluviais, entenda-se sarjetas e sumidouros de águas.
Ainda vamos a tempo de inverter a “tradição”. Podemos começar por replantar, com árvores autóctones, a floresta que ardeu nos últimos anos, limpar e desobstruir linhas de água, sem descurar o subterrâneo dos aglomerados urbanos. Se o Estado começar por fazer, por dar o exemplo em terrenos à sua guarda, acredito que chegaremos ao objetivo final: prevenir para não remediar.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.