Três registos para um mesmo caso. Uma conferência sobre Esquizofrenia e Psicologia-Aplicada Forense, uma investigação criminal e um monólogo de inspiração joyciana. Tudo para tentar retirar Dionísio do labirinto em que se encontra. Filho de uma prostituta, ele sente-se transfigurado num centauro e não hesita em vingar a morte da mãe com vários crimes. Mas se a sinopse pode orientar o leitor, nada o prepara para o ritmo da fala e do pensamento desta narrativa, registos que Rui Vieira, 46 anos, tem vindo a explorar nos seus romances, desde a estreia, em 2005, com Guardador de Almas. Vozes e ecos conjugam-se, em No Labirinto do Centauro (Abysmo, 140 pp, 15 euros), para indagar os mecanismos do pensamento e do cérebro humano.
Esta é a história de uma metamorfose?
A mudança (metamorfose) que a personagem sofre é comportamental, uma alteração de comportamento que não controla, recalcada por imagens da infância, mas que de alguma forma sabe quando está acontecer… No sentido da metamorfose física, não, nunca senti a personagem presa a uma pele que não é dele, não começa a galopar como um cavalo ou a trote ou algo do género – não se transforma num inseto como a personagem de Kafka -, mesmo o comportamento que apresenta é ambíguo como a própria existência de um centauro bom e um centauro mau (Quiron e Ixion).
Porque recorreu à figura do centauro como representação de Dionísio?
Pela coexistência do Bem e do Mal em duas personagens idênticas, embora diferentes, mas fantásticas da mitologia, e porque o livro começou por uma imagem, que o atravessa desde a primeira página à última, que foi realmente ver um balão com forma de cavalo a planar no ar ‘colado’ ao teto e aos poucos a murchar e a perder a forma.
O que lhe interessou na esquizofrenia e na sua problematização criminal?
Apenas o facto de ser comum associar a esquizofrenia a atos violentos, no século XIX era comum associar-se o crime à loucura. A esquizofrenia é uma perturbação mental grave, uma doença do cérebro, e tive interesse em explorar este desconhecido. Os dois hemisférios do cérebro são conhecidos pelo Lógico e pelo Artístico, e esta classificação permite fazer uma interrogação sendo o Mal não lógico será então artístico? E será a Loucura uma forma de Arte para quem o cérebro reconhece esta mesma loucura como Lógica? São interrogações que se espalham pelo livro nos três planos que o compõem: a vida, na primeira pessoa, da personagem Dionísio; um seminário com diversas personalidades a falar sobre Psicologia-Aplicada Forense; e, a investigação policial.
Seduz-lhe o registo policial?
Como policial puro, devo confessar que não, o próprio livro, embora, num dos planos, desenvolva a investigação policial, recorre mais ao comportamento e à personalidade dos investigadores que à investigação de factos per si.
O monólogo joyciano, que recria no último capítulo, parece-lhe a melhor aproximação ao pensamento?
É, para mim, o que mais se aproxima da velocidade do pensamento. Não sei se não será o exercício literário mais difícil de conseguir, pelo menos para mim: escrever sem respirar mantendo as regras da escrita.