As palavras e os seus sentidos, os desvios e mudanças na tradução e na transposição para outras linguagens configuram o universo de que Ana Torfs se ocupa desde os anos 90. Um trabalho marcado por uma certa dimensão poética e irónica que a artista belga, nascida em 1963, tem desenvolvido como uma verdadeira identidade criativa e que agora traz ao CAM da Fundação Gulbenkian, a partir de 11, com Echolalia.
O nome da exposição, a primeira individual que realiza no nosso país, remete justamente para o universo das palavras, já que o termo designa o “papaguear” das crianças quando aprendem a falar, balbuciando e repetindo, mas também a afeção que se traduz na forma como algumas pessoas repetem compulsivamente as expressões e frases de outros.
São quatro instalações que se ligam de algum modo por essa ideia de repetição, pelo que ressoa do original, recorrendo Torfs a diferentes meios de reprodução, som, vídeo, fotografia, diapositivos, serigrafias e tapeçarias, para explorar o modo como sons e imagens vão divergindo no processo de passagem para outros media ou na interpretação, fazendo eclodir novos sentidos e narrativas.
Ana Torfs, que tem exposto em diferentes países, abordou as questões da linguagem e da representação, usando as palavras em anteriores intervenções, partindo por exemplo do diário de viagem de Cristóvão Colombo para criar The Parrot & the Nightingale, a Phantasmagoria, refletindo sobre os nomes científicos, em latim, de 25 famílias de plantas, com Family Plot, ou sobre uma série de “palavras errantes”, em seis estrangeirismos, em TXT, Engine of Wandering Words, ou os nomes comuns de 20 corantes sintéticos, em STAIn. A curadoria de Echolalia, recentemente apresentado no Wiels Museum, em Bruxelas, e que vai ficar patente no CAM até 13 de junho, é de Caroline Dumalin.
É um momento inaugural da programação expositiva da Fundação Gulbenkian para 2016, que avança uma mudança de fundo na própria organização das duas coleções que constituem o acervo da instituição. A primeira, criada por Calouste Gulbenkian, refletindo o gosto do colecionador, a partir de 1956, agora denominada Coleção do Fundador, reúne um importante património. A segunda, do Centro de Arte Moderna, desenvolvida a partir da sua morte e ainda em aberto a novas aquisições, que passa a chamar-se Coleção Moderna, dá uma alargada e essencial panorâmica da produção artística do século XX à atualidade. Juntam-se agora num único museu, o Museu Calouste Gulbenkian.
Sabe-se que a união faz a força e a estratégia de junção dos dois núcleos museológicos não terá perdido de vista esse adágio. O propósito é alargar o público, fazendo cruzar os visitantes pelos dois acervos, promovendo mais a Coleção Moderna internacionalmente, proporcionando uma maior amplitude da oferta. E procurando explorar novos diálogos e relações expositivas. Uma intenção já ensaiada, de resto, em anteriores exposições, dois Meeting Point, que convocaram obras das duas coleções.
O Museu Gulbenkian será dirigido por Penelope Curtis, a historiadora de arte e curadora britânica, antes responsável pela Tate Britain, a trabalhar na Fundação desde setembro do ano passado. A nova organização implica também equipas transversais. Uma mudança que arranca em junho, assinalando os 60 anos da Fundação. E espelhada na exposição que o comemora, tomando o ano de 1956 como centro, e que “vai cruzar as duas coleções e mostrar o modo surpreendente como ambas refletem o século XX”, segundo Penelope Curtis, que assina a curadoria com João Carvalho Dias e Patrícia Rosas. MORE OR LESS ocupará a galeria de exposições temporárias do edifício sede da Fundação de junho a dezembro.
Mas o primeiro fruto dessa ‘comunhão de bens’ poderá ser visto já em maio, com inauguração a 12. Trata-se de Kumkapi: Tapetes Voadores, que irá apresentar pela primeira vez um conjunto de quatro tapetes Kumkapi dos séculos XIX e XX – três do tapeceiro arménio Hagop Kapoudjian (1869-1946), cujo percurso de vida revela pontos afins com a trajetória do próprio Calouste Gulbenkian -, da Coleção do Fundador, a par de um tapete contemporâneo do artista Mehkitar Garabedian, representado no Pavilhão da Arménia na última Bienal de Veneza. A curadoria é de Clara Serra e Rita Fabiana. Para ver até 12 de setembro.
Nesse mês, a anunciar o Outono, a 17, inaugurará no CAM, hall, nave e salas A e B, uma antológica, Luanda Los Angeles Lisboa, de António Ole, um dos nomes de referência da contemporaneidade angolana. O artista tem desenvolvido o seu trabalho em estreita cumplicidade com a arquitetura e a história de Luanda, explorando uma verdadeira paleta de linguagens da escultura à instalação, passando pela pintura, pelo desenho, fotografia ou filme. Uma exposição, comissariada por Isabel Carlos e Rita Fabiana, que poderá ser vista até ao fim do ano.
Também com curadoria de Rita Fabiana, será de não perder a retrospetiva de José Escada, a partir de 30 de junho. Uma mostra que irá revisitar o universo único do pintor, um dos fundadores do Grupo KWY, através de um conjunto de desenhos, pinturas, relevos e ilustrações. Até 31 de outubro, na galeria 1 do CAM.
Uma instalação no jardim de Fernanda Fragateiro irá, por outro lado, marcar o estio na Gulbenkian que propõe, de 23 de junho a julho, um Festival de Verão, com o envolvimento de diferentes áreas e o contributo de obras e filmes da coleção. No âmbito desse festival, realizar-se-á a exposição Convidados de Verão, comissariada por Penelope Curtis e Leonor Nazaré, em que se procura intensificar diálogos e implicações entre as obras contemporâneas de vários artistas portugueses e estrangeiros e peças do referido acervo.
Uma primeira de três incursões no universo da Coleção Moderna, que pretendem abordar o contexto histórico, cultural e social de Portugal desde 1900 até aos nossos dias, vai inaugurar entretanto a 30 de junho. Dará a ver obras sobre papel, com base no arquivo da Biblioteca de Arte da Gulbenkian, seguindo-se trabalhos de pintura, em novembro, e posteriormente esculturas. A curadoria desta nova apresentação da coleção é de Ana Vasconcelos, Ana Barata, Rita Fabiana, Leonor Nazaré, Patrícia Rosas e da diretora do Museu Calouste Gulbenkian.
De sublinhar ainda uma mostra, no âmbito da Trienal de Arquitetura de Lisboa, A obra ou o campo de batalha da Arquitetura, com curadoria de André Tavares. Em sete módulos, serão apresentados seis casos de estudo, com maquetes, relatórios técnicos, filmes, fotografias, desenhos. Entre eles, documentos dos Arquivos CCA de Montreal e da Cité de l’Architeture de Paris. De 6 de outubro a 18 de dezembro, no edifício-sede da Fundação Gulbenkian.
Gulbenkian – Duas Coleções, um museu
Para maior visibilidade e projeção internacional de um património artístico da antiguidade aos nossos dias, a coleção ainda em aberto do Centro de Arte Moderna junta-se à coleção fechada feita pelo fundador, num só Museu Calouste Gulbenkian, sob a direção de Penelope Curtis. Uma mudança que vai assinalar os 60 anos da Fundação Gulbenkian, em Junho, com uma grande exposição que promete revelar algumas raridades, no confronto e nas inter-relações entre as duas coleções, mas que tem um primeiro momento da nova conceção museológica já a 11, com a inauguração de Echolalia, a primeira mostra no nosso país da artista belga Ana Torfs
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