No tempo em que as contas se faziam em contos, Vítor e Manuela (nomes fictícios) compraram, em 1995, um apartamento por 12 150 contos (um pouco mais de 60 mil euros). Catorze anos mais tarde, na sequência da execução de uma dívida, o imóvel acabaria por ser vendido num site de leilões, por 102 mil euros. Porém, até hoje o comprador nunca tomou posse da casa. Motivo: uma lei aprovada durante o período mais grave da Covid-19 ainda se mantém em vigor, reforçando a proteção dos residentes, caso se trate de “casa de morada de família”.
O caso de Vítor e Manuela foi apreciado, no passado mês de fevereiro, pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), e o histórico do processo mostra que, após o leilão, em 2019, Vítor alegou não poder sair da casa, uma vez que se tratava da morada de família. Entretanto, no início de 2020, o País foi assolado pela pandemia da Covid-19, e o comprador, depois de ter tentado a saída coerciva dos habitantes do imóvel, refere estar ciente de que, segundo a lei 1-A/2020, de 19 de março, este tipo de diligências estava suspenso. Ainda assim, pediu ao juiz do processo para proferir despacho nesse sentido, até com recurso à polícia, sendo que aquele apenas poderia ser cumprido quando tais medidas cessassem.