Passaram-se cinco meses desde que Francisco Moita Flores, 70 anos acabados de fazer, tombou no stand da Leya, minutos antes de começar a sua sessão de autógrafos do livro A Despedida de Ulisses. Tombou enquanto ainda sentia na boca o crepitar do açúcar que cobria a fartura que o detivera no alto do Parque Eduardo VII nessa mesma tarde de domingo. Lembra-se da paragem gastronómica, um ritual de anos, sempre que ia ao certame, mas de pouco mais – nem poderia imaginar que essa seria, ironia das ironias, a última fartura da sua vida. Não que tenha morrido, como esta entrevista, a primeira desde o enfarte, atesta. Mas, de certa forma, morreu. Morreu para os fritos e para todos os pecados, dois maços de cigarros diários no topo deles, que confessa nas linhas que se seguem e também no livro Um Enfarte no Alto do Parque, acabado de publicar. Sem mágoas, mas sim com satisfação por ter sobrevivido, graças ao célere socorro de uns médicos que andavam por lá a comprar livros. Assim começou a sétima vida do escritor Moita Flores, reformado de professor de Biologia, inspetor da Polícia Judiciária, ator, argumentista, político, comentador de televisão.
Existe um Moita Flores a.e. e um d.e., marcado pelo dia do enfarte?
Foi um acontecimento tão brutal, tão extraordinariamente violento, que me obrigou, na minha idade, a um processo de autoanálise para perceber o que posso fazer para ficar por cá mais uns anos.