Há mais de um ano que Núria abandonou as aulas da faculdade. Quando a notícia se espalhou com a força de um maremoto, deixou de ir à rua com medo de que a reconhecessem. Deixou até de abrir as janelas porque vivia perseguida pela sensação de que alguém, do lado de fora de casa, andava a espiá-la. Pôs baixa durante um mês e meio do seu trabalho em part-time, com receio de que algum cliente percebesse quem era e lhe apontasse o dedo por ser “a miúda dos vídeos” ou “a miúda que faz sexo para os outros verem”. Ainda tem o Código Civil em cima da mesa da sala, mas já duvida de que algum dia consiga ser advogada: “Quando pesquisarem o meu nome no Google, vão logo achar que não sou credível. Quem me vai contratar? Vou sempre ser uma mancha para uma empresa”, questiona-se. Quanto mais pensa, mais os seus olhos grandes se vão fechando para o chão.
Já passaram 16 meses e ainda hoje recebe mensagens diárias com insultos. Que é “uma porca”, que “não vale nada”, que é “uma vergonha nacional”. Perguntam-lhe “quanto cobras?”, dizem-lhe “se te apanho na rua, espanco-te”. Isolou-se, procurou ajuda psicológica e pergunta-se se algum dia será capaz de voltar a confiar em rapazes. Ainda tentou um namorico, mas a coisa falhou. “Contei-lhe o que me tinha acontecido e ele, que já me conhecia antes disso, até foi compreensivo. Mas quando nos chateávamos, ele dizia sempre: ‘Imagina o que é assumir uma relação com uma miúda que está nua na internet.’”
Núria Silva tinha apenas 21 anos quando foi vítima de pornografia de vingança, o nome dado à divulgação não consentida de fotografias e vídeos íntimos. O fenómeno não tem parado de crescer e teve um boom em 2020, muito à boleia do confinamento e das aplicações de mensagens instantâneas, como o WhatsApp e o Telegram, de redes sociais como o Facebook, o Twitter ou o Instagram, ou dos sites de armazenamento e partilha de conteúdos como o Discord e o Volafile, onde alegadas fotos e vídeos íntimos de miúdas são armazenados em pastas com os seus respetivos nomes. Assim mesmo, como se estivessem todas num catálogo, à mercê de quem queira vê-las.
Este artigo não está disponível na íntegra no site. ASSINE AQUI e leia a edição digital da VISÃO em primeira mão.
Se JÁ É ASSINANTE da VISÃO digital, leia na aplicação a nova edição ou clique AQUI.