Há histórias que contadas ninguém acredita. Mas esta tem a particularidade de ser relatada na primeira pessoa. Em março de 1996, Paul Templer era apenas o dono de uma empresa turística de passeios de caiaque pelo rio Zambeze, junto às cascatas de Vitória, na fronteira entre a Zâmbia e o Zimbabué. Mas o ataque de um hipopótamo que habitava no local alterou o rumo da sua vida. Como tudo aconteceu?
Um dia, Paul e mais três guias aprendizes, Mike, Ben e Evans, conduziram uns clientes num passeio de caiaque habitual. “Estávamos perto do final do passeio, a luz estava a suavizar e estávamos a aproveitar a tranquilidade. A pancada sólida que senti atrás de mim apanhou-me de surpresa” relata. O hipopótamo revelou-se e atacou o barco de Evans, que caiu à água. De seguida, Paul ordenou que os restantes guias levassem os clientes para as margens e os colocassem em segurança. Entretanto, “virei meu barco e remei furiosamente em direção a Evans”.
“Estiquei a mão para agarrar mão dele, mas quando os nossos dedos estavam prestes a tocar, fiquei envolvido na escuridão. Não houve nenhuma transição, nenhuma sensação de aproximação do perigo. Era como se de repente tivesse ficado cego e surdo”, contou, ao The Guardian.
“Eu sabia que minhas pernas estavam cercadas por água, mas minha parte superior do corpo estava quase seca. Parecia estar preso em algo viscoso. Havia um cheiro terrível e sulfuroso, como ovos podres, e uma tremenda pressão contra o meu peito. Os meus braços estavam presos, mas consegui libertar uma mão e senti o que estava à volta – a minha palma passou pelas cerdas rijas do focinho do hipopótamo. Foi aí que percebi que estava debaixo de água, preso até a cintura na boca dele”.
Paul conseguiu soltar-se instantes depois, mas quando voltou a tentar nadar em direção ao colega, o hipopótamo voltou a atacáa-lo. Os dentes do animal causaram-lhe lesões graves por todo o corpo, tanto que “um médico mais tarde contou quase 40 feridas”. Apesar da coragem e dos esforços, Paul não conseguiu chegar até ao amigo. O corpo foi, dias mais tarde, encontrado no rio.
Quanto ao próprio Paul, foi capaz de chegar até à margem, onde Mike lhe prestou os primeiros cuidados: “Por acaso, uma equipa médica estava por perto, num treino de emergência, e com a ajuda deles, fiquei vivo o tempo suficiente para chegar a um hospital com um cirurgião. Ele avisou-me que provavelmente teria que amputar os meus braços e a parte inferior da minha perna. No final, perdi apenas o meu braço esquerdo”.
O acidente foi uma autêntica viragem na vida de Paul, sobretudo a nível psicológico. Como se pode ler no seu site pessoal, “imediatamente após o ataque, Paul navegou desajeitadamente no espaço escuro disfuncional que parecia esticar-e à sua frente; sua vida foi, quase literalmente, rasgada”.
Hoje em dia, Paul tenta inspirar os outros a não desistir perante as imprevisibilidades da vida. É orador em vários eventos, onde relata a história do dia em que foi quase comido por um hipopótamo, e como recuperou o seu estado físico depois do acidente. Ao nível de, com apenas um braço, ter realizado uma expedição de três meses em caiaque, desde a nascente até à foz do rio Zambeze.