“Sabemos que a nossa filha ainda tem um longo caminho pela frente, e irá precisar de mais tratatamentos, mas desde que soubemos que o medicamento ia ser comparticipado a 100 por cento que estamos a ajudar outras famílias que se debatem com a mesma doença.” Em resumo, foi isto que os pais da bebé Matilde, Carla Martins e Miguel Sande, quiseram deixar esclarecido numa conferência de imprensa que decorreu esta tarde, em Lisboa. “Quem nos dera que fosse só tomar o medicamento e tudo estava resolvido”, desabafou ainda a mãe.
Antes já o pai fizera questão de recordar que o objetivo inicial da angariação de fundos era viajarem para os EUA, onde poderiam comprar o fármaco – e que só não foram porque “no momento em que alcançámos a verba necessária para o fazer, a nossa filha estava nos cuidados intensivos”, disse.
Insistindo que o dinheiro tem sido monitorizado pelas entidades competentes, o pai da bebé revelou ainda que “não houve mais publicações sobre a quantia disponível a conselho da entidade bancária em que a conta foi aberta”, no caso, a Caixa Geral de Depósitos. “Temos mais filhos e temos de nos proteger”, acrescentou a mãe.
Foi no início do verão que o país se emocionou – e se solidarizou – com a história de Matilde, uma bebé de poucos meses que nascera com atrofia muscular espinal do tipo 1. Causada por mutações num gene, o SMN1, aquela doença genética rara caracteriza-se por perda de força e de capacidades motoras e ainda uma paralisia progressiva. Considerada a principal causa genética da mortalidade infantil, o tempo médio de vida dos seus portadores não costuma ultrapassar os dois anos.
A única esperança, já se sabia, estava no Zolgensma, medicamento experimental só disponível nos EUA e apontado como o mais caro do mundo. Para o conseguir comprar seriam precisos 2 milhões de euros e foi a pensar nisso que, a 12 de junho, dia em que a filha completava dois meses, os pais se decidiram a contar a sua história no Facebook, criando a página Matilde, uma bebé especial. Rapidamente se gerou uma onda solidária, que se tornou um crowdfunding nacional, alcançando em menos de um mês perto de 250 mil seguidores e o dinheiro necessário para pagar o tão ansiado medicamento.
Eis que, de olho na intenção, se soube que a Agência Europeia do Medicamento só autorizaria a utilização do fármaco na Europa se o mesmo fosse comprado pelo Estado. E que o Estado poderia custeá-lo caso houvesse uma prescrição médica e nenhuma terapia alternativa no mercado. Pouco depois haveria de se confirmar a Autorização de Utilização Especial (AUE) dada pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde e a disponibilização do Zolgensma – a ser usado pela primeira vez no nosso país – sem custos para o doente.
Esta não era, no entanto, a única boa notícia neste caso: pouco depois soube-se ainda que havia dois pedidos de AUE assinados pela mesma médica e que Matilde não era a única bebé internada no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, com a mesma doença degenerativa neuromuscular. E foi assim que Natália, 11 meses e o mesmo diagnóstico,, acabou por beneficiar da medida. Receberam ambas o medicamento esta terça-feira, 27 e tiveram alta pouco mais de 24 horas.
Segundo já explicou Teresa Moreno, neuropediatra daquele hospital, a terapêutica travará a doença, mas não oferece propriamente a cura, e, mesmo assim, só devem começar a sentir efeitos positivos (diminuição de apoio respiratório, bloqueio da doença e ganho de qualidade de vida) dentro de um mês. A vigilância deverá ser apertada, com exames uma vez por semana e até três meses depois da administração do mesmo.