“As atividades de aprendizagem devem ser realizadas na escola”, afirma António Ponces de Carvalho, presidente da associação das escolas João de Deus, em Lisboa. “Os trabalhos de casa são fundamentais para consolidar a aprendizagem”, defende, por seu lado, a professora de Educação Visual Raquel Nery, docente do 2.º ciclo na Escola Dr. Costa Matos, em Vila Nova de Gaia.
Os argumentos dos defensores e dos detratores dos trabalhos de casa estão longe de estarem esgotados.
“Quando os alunos passam o dia inteiro na escola, até às cinco ou seis da tarde, ainda vamos estar a passar-lhes TPC?”, interroga Ponces de Carvalho. “Seria quase maus-tratos infantis”, dispara.
Raquel Nery não hesita no momento de elencar as vantagens dos TPC: “Criam hábitos de estudo e responsabilizam os alunos.” Além disso, “ensinam a gerir o tempo e a respeitar prazos.”
Para cumprir essa missão não são necessárias tarefas hercúleas: “Podem ser pequenas coisas que ajudam a refletir sobre o que foi feito nas aulas e a perceber se há dúvidas”, esclarece.
Ponces de Carvalho defende que é fundamental saber “gerir o ócio” e lembra que “a acomodação da aprendizagem muitas vezes acontece em períodos de relaxamento”. É lapidar: “Não é o TPC que ensina o que o professor não conseguiu ensinar na sala de aulas”. Também por isso a escola tem a política de não enviar trabalhos de casa durante as férias.
O responsável pela IPSS acusa o TPC de limitar a criatividade e a imaginação das crianças e jovens. “O professor deve despertar a curiosidade dos alunos e, se for bem-sucedido, eles vão procurar saber sozinhos”, acredita.
A docente de Gaia discorda: “Se a professora de português pedir para fazerem um poema, é óbvio que estimula a criatividade.” E acrescenta: “Se dissermos simplesmente para estudarem é muito vago e a maioria não estuda. Os estudantes precisam de regras e de orientação”, assegura Raquel Nery.
Levar a desigualdade na mochila
A docente do 2.º ciclo considera que os TPC podem ser uma forma de envolver os pais na vida escolar dos filhos, ficando a par do que se passa na escola.
Mas Ponces Carvalho alerta para o perigo de os trabalhos de casa acentuarem a desigualdade social. “Quando os pais não dominam as matérias isso causa-lhes grande angústia. O tempo em família não deve ser passado com os pais a assumirem o papel dos professores”, afirma, perentório.
Raquel Nery contesta o argumento. A solução, no seu entender, é não valorizar demasiado o TPC. “A grande competência dada pelos trabalhos de casa é a responsabilização, não é fazer tudo bem.”
A experiência diz-lhe que é fácil perceber quando o TPC tem a mão dos pais. Afinal, “os professores conhecem os alunos no quotidiano”, remata.
Apesar de ser favorável aos trabalhos de casa – “como professora e como mãe” – a docente alerta para a importância de haver bom senso “na quantidade de tarefas e no prazo para as realizar”. O seu método é enviar TPC uma vez por semana, tendo os alunos sete dias para o fazer. “Um trabalho de casa por semana, por cada disciplina, é um bom hábito de trabalho”, acredita. Agora, “se for em demasia torna-se contraproducente”, admite.
Nas escolas João de Deus, a filosofia é a de que o aluno deve ser mais autónomo. “Se um aluno tem uma determinada dificuldade, é incentivado a encontrar tempo para praticar e melhorar a sua prestação.” Ponce de Carvalho dá um exemplo: “Uma criança com dificuldades de leitura pode ler uma receita aos pais enquanto fazem jantar”.
Raquel Nery não tem dúvidas de que os TPC ajudam a melhorar os resultados dos alunos, já Ponces de Carvalho defende que, em casa, a relação com o conhecimento deve estar livre de obrigações.
O debate segue dentro de momentos.