Pedra Badejo é uma cidade na costa da Ilha de Santiago, em Cabo Verde. Lá, quatro jovens portuguesas vivem o dia a dia da população para tentar melhorar as vidas das “suas” crianças de rua. Inês Carrola, Marisa Lopes, Bárbara Araújo e Raquel Couto partiram numa aventura de seis meses e meio que prometia melhorar as condições de vida da população local. Ou pelo menos das crianças. A cidade cabo-verdiana já tinha recebido duas destas voluntárias, em 2015 e em 2016 – Inês e Marisa – que rapidamente se apaixonaram pelas suas gentes e quiseram continuar a fazer a diferença. “Depois de contactarmos com esta realidade e percebermos as dificuldades por que passam, não conseguimos ignorar ou ficar indiferentes”, conta Inês.
Inês e Marisa decidiram que tinham de voltar. A elas juntaram-se Bárbara Araújo e Raquel Couto, e todas partiram rumo ao calor e pobreza de Cabo Verde, trocando o conforto do seu país: “Na hora da partida, as nossas famílias compreenderam e apoiaram a nossa decisão. Sabem que é o concretizar de um sonho. Por isso é que se torna mais fácil deixar tudo para trás.”
Voltaram porque sim. Porque não podiam fechar os olhos ao que viram. “Quando cá estivemos, vimos e lidámos com muitas crianças de rua, que passavam o dia sem ir a casa. Por isso, pensámos que tínhamos de arranjar uma sala e apoio escolar para elas. Queríamos criar um projeto que resolvesse estes problemas”, explica Inês.
Antes de partirem, decidiram que não podiam ir de mãos a abanar: em dezembro, a um mês da partida, as quatro organizaram uma angariação de fundos que funcionou, acima de tudo, “através do passa-palavra”. “Inicialmente foi através de familiares e conhecidos. Tudo feito a nosso custo, porque andámos com os carros a recolher os materiais. Tivemos muito mais adesão do que estávamos à espera”, diz Inês.
Com a ideia bem definida do que queriam – tirar da rua as crianças que passam todo o dia sem ir a casa e organizar-lhes atividades que as preencham e ocupem –, quando lá chegaram descobriram que já existia algo similar ao projeto que tinham idealizado: “Falámos com o ICCA (o Instituto Cabo-Verdiano da Criança e do Adolescente) e, a partir daí, percebemos que a solução passava por nos juntarmos a esse projeto em vez de criar um de raiz.”
No centro de dia Enfermeiro Lindo, que lida com 45 crianças com idades entre os 6 e os 12 anos, as quatro jovens vão dividindo o seu tempo entre os miúdos. “De manhã apoiamos aos miúdos com idades entre os 10 e os 12 anos, dando aulas em inglês, porque sentimos que eles próprios gostam e se interessam, além de lhes fazer bem. De tarde, damos apoio a crianças dos 6 aos 10, e temos também atividades relacionadas com a música, dança e jogos. Estamos a tentar introduzir ateliês de teatro, cidadania e ambiente, para os ir educando noutras áreas. Além disso, já recebemos o contentor, que, esperamos nós, vem colmatar algumas das necessidades, como um frigorífico, um fogão, livros, material escolar e muitos brinquedos.”
Mas as necessidades são demasiadas, confirma Inês. “Muitas destas crianças estão em situação de risco. Há crianças que frequentam o quarto ao sexto ano e não sabem fazer contas. Têm grandes dificuldades em falar português, porque os professores facilitam e acabam por falar em crioulo. Não há segurança no local das aulas, com vidros partidos e muito frio, tem pouca luz e é constantemente assaltado. As crianças têm acesso a poucos livros e só há duas bolas para brincar. Muitas vezes, só vão ao centro para comerem uma refeição quente, que é a única do dia, em grande parte dos casos”, esclarece.
Na data da partida, as quatro jovens iam com o objetivo não só de ajudar as crianças, através de atividades, como remodelando-lhes o centro de dia, para que tivessem acesso a outras condições. “Inicialmente, queríamos pintar as instalações. Pôr uma banca nova, luzes, tornar mais seguro”. No entanto, quando chegaram a Pedra Badejo, o cenário encontrado foi outro: “Falámos com a ICCA, que nos disse que o centro ia receber instalações novas. Estamos à espera de ver o local para perceber se precisamos de fazer algumas remodelações.”
Cerca de um mês depois da chegada a Pedra Badejo – as quatro jovens chegaram a 15 de janeiro –, as voluntárias estão felizes com o que têm feito até então: “O ritmo de Cabo Verde é muito diferente do de Portugal, mas já conseguimos o contentor, que era algo muito importante. Assim que o recebemos, fomos fazendo logo alguma distribuição, mas pouca. Temos que contabilizar bem o que temos, para distribuir da forma mais justa. Enquanto esperávamos, divertimo-nos muito também. Estivemos a conhecer a cidade, as crianças com quem íamos trabalhar… São um desafio.”
(Artigo de Cláudia Fernandes)