A primeira tarde eleitoral de Rui Rio junto do País real iniciou-se no Largo do Senhor da Cruz, em Barcelos, mas quando a caminhada em direção à Rua Direita começou já o enésimo calvário mediático do líder do PSD estava montado.
Na origem do sururu político não esteve qualquer polémica a propósito de propostas eleitorais, mas sim um tweet publicado pelo candidato “laranja” a propósito do voto antecipado, em mobilidade, do secretário-geral do PS no Porto: “O Dr. António Costa arranjou uma forma airosa de evitar ter de fazer o que sabe que não é bom para Portugal; ter de votar nele próprio. Chapeau!”, escreveu Rio. A ideia, pelos vistos, era ironizar com o facto de Costa votar habitualmente em Lisboa – onde, de resto, o voto será contabilizado – mas gerou turbulência nas hostes socialistas. “Sim, sou eu que escrevo a maioria dos meus tweets”, garantiu Rui Rio num dos momentos em que a VISÃO lhe travou a passada. “Isto é para ter algum sentido de humor ou então não vale a pena”, reforçou. No PS, não acharam graça. E acusaram-no de induzir em erro os eleitores. Mas Rio insistiu que era uma “brincadeira” e pediu alguma descontração e capacidade de encaixe aos adversários, assumindo que nunca entrará no registo insultuoso. “Isso não”.
Sá Carneiro e o “pimba”
Na terra onde Francisco Sá Carneiro tinha raízes familiares (por parte do pai), o líder do PSD recebeu de prenda, na pequena sede de campanha, um busto do fundador. Perguntamos-lhe na ocasião se Barcelos teria sido escolhida por esse simbolismo associado ao “mais que tudo” dos sociais-democratas, mas o antigo autarca foi igual a si próprio: “Não. Como eu estava no Porto hoje, era mais fácil vir aqui…”. Depois subiu ao púlpito de um palco improvisado para se dirigir a alguns molhos de aficionados, numa artéria estreita, mas o enquadramento cénico não ajudou: o pano de fundo refletia rostos animadores dos candidatos a deputados pelo distrito, entre eles André Coelho Lima, mas, visto de outro ângulo, Rio parecia falar para as paredes: prédios sem vivalma, de varandas despidas e persianas e portadas cerradas. Em poucos minutos, o candidato arrumou o assunto: acusou os socialistas de fazer o que faz desde o tempo em que combatiam a Aliança Democrática (AD): “Quando sentem que podem perder, começam a deturpar as nossas propostas e a amedrontar as pessoas”, acusou. Em fundo, gritara-se: “Assim se vê a força do PSD!”, mas a rima, originária de outras latitudes ideológicas, saiu desconfortável da boca do coro de apoiantes. Rio não se perturbou e continuou: garantiu que não vai privatizar a Segurança Social nem pôr as pensões na bolsa. E pediu aos adversários que se concentrassem nas suas próprias propostas, em vez de “deturparem” as dos outros. Ou seja, que façam “uma campanha pela positiva”. Quanto às sondagens desfavoráveis, não se atormenta. E lembrou que, nas primeiras eleições autárquicas que ganhou (2001, Porto), não lhe davam mais de 19 por cento. “Acabei por ter quarenta e tal por cento…Tem de haver mais decência nisto…”.
Se a sondagem de rua vale alguma coisa, a de Barcelos não lhe correu mal. “Nota-se alguma coisita acima do habitual…”, comentavam elementos do seu staff, “mas isso, se calhar, não quer dizer nada”. Militantes eram às dezenas, mas havia caudais de povo nas ruas, uns apenas curiosos para ver o candidato de perto, outros para tirar selfies com ele e outros ainda para lhe gritar “vivas” e “força” ou lhe entregarem cartões, como aconteceu com Francisco Martins, “veterano de guerra”, que pediu a Rio para mudar as regalias do Cartão do Antigo Combatente: “Não dá para nada. Se quiser ir daqui ao Porto de autocarro, não posso: só é grátis até à Trofa”, queixou-se.
Situações destas acontecem porque as pessoas insistem em aproximar-se dele, mas o contrário raramente acontece. Nas zonas por onde Rio andou, decorriam os típicos despiques populares de domingo em Barcelos, pequenos arraiais montados por familiares e amigos com colunas de som e a debitar cançonetas de teor apimentado e bailarico a condizer. Rio passou literalmente ao lado deles, mas, na verdade, já tinha o seu próprio folclore: através de roufenhas colunas de som e altifalantes de trazer pela mão, ouviu-se, durante todo o percurso a pé por Barcelos, um dos hinos da campanha, cantado por voz feminina de fazer saracotear o povo. Foi-lhe oferecido pelo cantor Emanuel, pai do “pimba” e seu apoiante confesso. A cantiga fala do Rio “que corre por Portugal” e tem “o povo no coração”. No coração, talvez. Aproximar-se dele já é outra conversa…