O dia 28 de maio, de reminiscências ditatoriais, foi o escolhido pelo Chega para marchar pelas ruas de Coimbra, começando no Largo da Porta Férrea, junto à universidade, acabando, uma hora depois, na estátua que homenageia os Heróis do Ultramar. Quando lhe perguntaram se a data simbolizava algo mais, André Ventura sorriu e ironizou. “Se o congresso fosse no dia em que nasceu Napoleão, ainda diziam que era por eu querer conquistar a Europa…”.
Até podia haver saudosistas do salazarismo entre as pessoas que se juntaram ao líder, mas o discurso não queria nada com o passado. Ventura, à frente da marcha, protegido por um cordão humano de coletes azuis do Chega, era o “one man show” de serviço. De microfone na mão, qual líder de claque, alternou entre o hino nacional, a urgência de devolver Portugal “aos portugueses de bem” e o facto de já não haver, segundo ele, cidades que são monopólio da esquerda. “As ruas também são nossas”, berrou, uma e outra vez. “Qual é o lugar do bandido? Na prisão!”, gritava-se, enquanto o antigo primeiro-ministro socialista era o bombo da festa. “Sócrates, ladrão, volta para a prisão!”, foi uma frase repetida durante todo o percurso, qual disco rachado. “Mais um processo para mim…”, gracejou Ventura, na verdade pouco incomodado com o assunto.
Diogo Pacheco de Amorim, que está de saída da vice-presidência, José Dias, Manuel Matias, entre outros, estiveram perto do presidente. Paula Ribeiro e Maria Sá, profissionais de saúde, viajaram do Porto para se manifestarem com bandeiras e cachecóis do Chega. Ambas “fartas do PSD”, aderiram ao partido de Ventura e sonham com uma aliança de poder para mudar Portugal. “Gostei muito do Rui Rio como presidente da Câmara do Porto”, referiu Maria Sá. “Mas desiludiu-me como líder do partido. Isto só lá vai se nos juntarmos”. As duas amigas recusam o epíteto de fascistas ou extremistas. “Nada disso”, interrompe Maria. “O que não queremos é trabalhar 12 e 14 horas por dia, seis dias por semana, e tudo ir para impostos”, acode Paula. “Simplesmente não queremos gente a viver à conta do Estado”. E lá foram elas juntar-se à multidão que pedia o mesmo.
Enquanto noutro ponto da cidade, organizações de esquerda se manifestavam contra a presença de “fascistas” na cidade, Ventura e as centenas de seguidores insistiam, rodeados de forte cordão policial: “Contra a corrupção, fascismo é distração!”. Cumprindo razoavelmente as distâncias recomendadas face à pandemia, de máscara posta, o Chega ordeiro lá foi calcorreando terreno, imaginando-se, em breve, no palanque do País. Ventura prometeu que o Chega… chegará ao Governo em breve, enquanto duas velhotas à face da estrada perguntavam onde estava o “fala-barato”. Pelo caminho, ainda houve troca de galhardetes. “Fascistas!”, gritavam uns, nos passeios. “Subsidiodependentes”, respondiam os da marcha, sem travar o passo. “Aperta com eles, André!”, pedia-se. E ele apertava, aos gritos contra a corrupção e a esquerda.
Chegado à estátua dos Heróis do Ultramar, André Ventura reclamou, de um palco improvisado, um País diferente daquele que trata “heróis com bandidos”. O se os milhões abundam para o Novo Banco ou para pagar subvenções a políticos, também não devia servir para outros portugueses…do mal. “Estamos sempre dispostos a colocar dinheiro nos coitadinhos de sempre, nos bandidos de sempre”. Por isso, preparem-se, anunciou ele: “Preferia meter a cabeça debaixo de água do que moderar-me”. Ouviste, PSD?