Tem 54 anos, nasceu em Joane (Vila Nova de Famalicão), é advogado e consultor jurídico de profissão e, de momento, o único representante do CDS em Bruxelas/Estrasburgo. Eis Nuno Melo, o eurodeputado que na semana passada voltou a envolver-se numa polémica que embaraçou parte do partido chefiado por Francisco Rodrigues dos Santos.
Apesar de estar a 1700 quilómetros do epicentro dos conflitos partidários nacionais, o antigo vice-presidente dos centristas e ex-líder parlamentar – que ganhou especial projeção com o inquérito à gestão e nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN), quando expôs com eficácia as fragilidades da supervisão bancária, à data liderada por Vítor Constâncio – tornou-se um dos ódios de estimação da esquerda e um dos responsáveis políticos mais satirizados no universo digital.
O último episódio, ocorrido na segunda-feira, 4, deveu-se a um tweet em que Melo apontou o dedo à utilização na telescola de um excerto de um pequeno documentário gravado e emitido pela RTP chamado Exposição do Mundo Português, em que Rui Tavares aparecia. Detalhe: o antigo eurodeputado pelo BE e fundador do Livre é historiador e os seis minutos do programa sobre o Estado Novo foram exibidos justamente devido a essa condição.
“Entre tantos, Rui Tavares foi escolhido para a telescola, destilando ideologia e transformando alunos em cobaias do socialismo. Nem disfarçam. Uma aviltante e ignóbil revolução cultural em marcha que pais sem recursos não podem evitar. Política travestida de educação. Miséria”, escreveu no Twitter, acompanhado, depois, pela sua bancada, que colocou uma questão ao Governo sobre a alegada opção.
Nos últimos anos, de facto, têm sido várias as situações controversas a envolver o ex-número dois do CDS. Recordemos algumas delas.
“Precisamos de pessoas, mas não de quaisquer pessoas”
Em 2018, por exemplo, aquando das últimas eleições presidenciais brasileiras, num debate com outros eurodeputados portugueses, Melo deplorava “qualquer pulsão totalitária”, fosse ela de que pendor fosse, mas recusava a “narrativa” da colagem de Jair Bolsonaro à extrema-direita – a menos que a candidatura de Fernando Haddad, o principal adversário, fosse também rotulada como parte da extrema-esquerda.
Em março do ano passado, em entrevista ao Expresso, gerou polémica uma declaração, puxada para título, em que o eurodeputado advogava algumas limitações à imigração na União Euripeia: “Precisamos de pessoas, mas não de quaisquer pessoas; têm obrigação de respeitar as nossas leis, tradições e cultura”. E contextualizou uma tirada anterior, em entrevista ao Observador, em que defendeu que “a Europa só deve acolher quem não nos faça reféns”: “Isto é, por exemplo, rejeitar a estupidez de escolas alemãs que proíbem que os alunos comam carne de porco.”
Ainda na pré-campanha para as europeias de 2019, Melo participou num debate dedicado ao tema “A caça e a Lei das Armas”, em Leiria. Antes disso, ao Diário de Notícias, explicou a sua oposição à proposta de alteração à Lei das Armas, anunciada pelo Governo, que iria transpor uma diretiva comunitária – que o democrata-cristão já tinha contestado, posição que mereceu o elogio do lobistas do setor.
“O que se tenta com esta alteração à lei é antigo e é limitar o mais possível o porte de arma. A questão é: um cidadão que não pertença às forças de segurança pode ou não ter armas? Eu acho que sim”, disparou. Algum tempo depois, em entrevista ao Observador, Assunção Cristas, então presidente do CDS, puxou-lhe o tapete. “Em Portugal, felizmente, esse não é um assunto e não será pela mão do CDS que passará a ser”, disse.
Vox? “Está para o PP como a Aliança para o PSD”
Já em abril, a um mês do sufrágio para o Parlamento Europeu, o cabeça de lista do CDS voltou a deixar o partido à beira de um ataque de nervos, recusando o rótulo de que o Vox, da vizinha Espanha, fosse um partido de extrema-direita e sugeriu até que pudesse integrar o Partido Popular Europeu, família em que se inserem PSD e CDS. “O presidente do Vox [Santiago Abascal] era do PP, é um basco filho de um histórico do PP, que, no essencial, tem a agenda política do PP com duas diferenças fundamentais, que têm que ver com as tradições, que mobilizam muito em Espanha: a festa taurina e a caça. E, depois, uma outra circunstância que levou a que fosse considerado radical, a questão das autonomias”, explicou.
O mal-estar estendeu-se a um recém-formado partido, o Aliança, de Pedro Santana Lopes. “O Vox estará para o Partido Popular [espanhol] como a Aliança está para o PSD”, reforçou, nessa mesma entrevista concedida à Lusa.
Na mesma altura, justificou a posição, numa ação de pré-campanha, e carregou sobre quem se posiciona do lado oposto do espetro político. “Curiosamente, não tratam o Podemos como uma força de extrema-esquerda. Convinha que definíssemos os pressupostos para então podermos catalogar os extremismos”, argumentou.
“Por que dizem que o Vox é radical? Por ser contra o aborto? Ou porque pede a revisão do sistema de autonomias que hoje existe? Eu gostava de recordar que em muitos países socialistas na União Europeia o aborto é proibido. Nesses países, esses partidos não são radicais, mas o Vox é porque defende a proibição do aborto”, acrescentou o candidato.
Greta, a “adolescente chorosa”
Em dezembro, Melo atirou-se ao aparato político que envolveu a passagem de Greta Thunberg por Portugal. No dia em que a ativista – que faz do combate às alterações climáticas a sua bandeira – chegou a Lisboa, o eurodeputado recorreu ao Twitter para fazer um remoque mordaz.
Intitulada “How dare you You have stolen my dreams” (Como se atrvem? Vocês roubaram os meus sonhos), frase que a sueca usou no discurso na sede da Organização das Nações Unidade, a publicação, acompanhada por uma foto da embarcação de Greta no Tejo, foi corrosiva: “Já de seguida, muitos deputados de pé, deslumbrados, aplaudindo a adolescente chorosa que os acusa de roubarem os sonhos e impedirem de ir à escola, enquanto navega mundo fora com estilo…”.
Igualmente nesse mês, João Quadros tornou público um processo-crime que Melo moveu contra si, em 2018, depois de um chorrilho de insultos com que o humorista (entretantou constituído arguido) o brindou nos últimos anos.
Quem também não morre de amores pelo representante do CDS em Bruxelas é Pedro Marques Lopes. As trocas de mimos entre ambos nas redes sociais são permanentes. Na mais acesa de todas, em março do ano passado, ainda propósito da questão do porte de armas, o comentador da SIC, da TSF e do Diário de Notícias chamou a Melo “o intelectual de Joane”.
A resposta, longe do habitual estilo truculento, foi, contudo, de uma acidez queriosiana: “Este Marques Lopes é mesmo do mais básico que há. Espécie de amiba, armado ao intelectual, sem cérebro que ajude à tarefa. Provinciano recalcado, fascinado com a descoberta tardia dos néon da capital. Frustrado em fase de sublimação, pela falta de convite de quem seja, para que abrilhante o parlamento com abundantes lugares comuns. Extraordinário a dar palpites sobre tudo, mesmo sobre o que ignora absolutamente, que é quase tudo. A perfeita anedota sem graça.”
Já este ano, em janeiro, Melo fez mira ao BE, na sequência de uma publicação do partido de Catarina Martins em que associava os incêndios na Austrália ao sistema capitalista. “Um país a arder: plantas queimadas, animais mortos, dezenas de pessoas perderam a vida e milhares estão em fuga. Não é fogo, é capitalismo”, referiam os bloquistas, que partilhavam então um mapa que não era real, mas, sim, uma “adaptação gráfica 3D das imagens de satélite captadas pela NASA”. A réplica saiu de pronto e com a simplicidade e ímpeto a que o País político se acostumou. Utilizou uma imagem de um cidadão a consumir drogas leves e concluiu: “Não é fumo, é Bloco de Esquerda.”
E ainda há a saga “Nuno Melo ataca/critica/recorda José Sócrates”, mas para essa guerra particular seria preciso um outro artigo…