A guerra é algo muito sério e Sean McFate sabe-o como poucos. Mas isso não impede este ex-oficial paraquedista da mítica 82ª Divisão do Exército dos EUA, antigo operacional de uma empresa militar privada (entenda-se, de mercenários) e atual investigador e docente na Universidade Georgetown, de ser irónico e um exímio praticante da incorreção política. “Perder é algo de odioso, para mim e não só. Estou cansado de ver amigos morrerem em ação devido ao baixo QI estratégico dos dirigentes. Como contribuinte, sinto-me revoltado por o governo ter desbaratado biliões de dólares noutros países, resultando daí apenas o agravar da situação no terreno. Como americano, abomino ver a honra nacional manchada por inimigos de fraco nível.” No seu entender, o Ocidente e o seu país padecem de “atrofia estratégica” por não saberem conduzir os conflitos bélicos em que se envolvem. E o Afeganistão é um bom exemplo. “Para eliminar o jihadismo, é preciso retirar legitimidade à ideologia e o ridículo consegue fazê-lo. O Estado Islâmico e os seus sucessores murchariam como o Feiticeiro de Oz se o mundo islâmico conseguisse rir-se deles a bandeiras despregadas. (…) Um colega da comunidade dos serviços secretos disse-me, uma vez, que talvez pudéssemos encurtar a época de combate dos talibãs se transmitíssemos as Marés Vivas [a popular série de TV dos anos 90, com Pamela Anderson] no Afeganistão. Além disso, ao que parece, os jihadistas são viciados em pornografia. Com certeza que um estratega inteligente consegue fazer qualquer coisa com esta informação.”
Esta é apenas uma das propostas que Sean McFate apresenta no seu livro A Nova Arte da Guerra, recém-publicado no mercado nacional pela editora Clube do Autor. No entanto, neste momento, não parece verosímil que os talibãs se deixem distrair com cenas de Pamela Anderson quando têm a histórica oportunidade de se entreter com algo que pode dar-lhes um prazer muito maior: voltar a mandar no Afeganistão e demonstrar que o país continua a ser um coveiro de impérios. Depois dos persas, dos mongóis, dos britânicos e dos soviéticos, os Estados Unidos da América e respetivos aliados são também obrigados a retirar-se, sem honra nem glória, do território onde chegaram há quase duas décadas – com o declarado propósito de acabar com um regime medieval (ver cronologia). E, suprema ironia, a presença militar norte-americana em terras afegãs ameaça terminar como começou: com os talibãs a liderarem aquilo a que chamam o Emirado Islâmico do Afeganistão.
241 mil
Total de mortos resultante do conflito afegão, desde o início da intervenção militar dos EUA, em 2001, segundo as estimativas da Universidade Brown
$2,261 biliões
Custos do conflito, segundo a mesma instituição (equivalentes a €1,9 biliões), para os cofres dos EUA
75%
Despesas públicas afegãs financiadas pelos EUA e pela comunidade internacional, segundo o Banco Mundial
80%
Produção mundial de ópio garantida pelo Afeganistão. Segundo a ONU, o país exporta agora mais heroína e opiáceos do que há 20 anos, e o narcotráfico representa mais de 40% do orçamento dos talibãs